03.06

Imprensa

Direito Tributário

Código de defesa do contribuinte avança no Congresso Nacional

Nícolas Pasinato

Na terça-feira passada, foi aprovado o requerimento de urgência para o Projeto de Lei Complementar 17/22, que institui um código de defesa dos contribuintes. De autoria do deputado Felipe Rigoni (União-ES) e outros 31 parlamentares, a proposta estabelece normas gerais sobre direitos, garantias e deveres do contribuinte, especialmente quanto a sua interação com a Fazenda pública.

O objetivo, segundo Rigoni, é diminuir a assimetria que existe hoje entre contribuintes e o Fisco. Para o deputado, o sistema tributário brasileiro funciona em uma lógica que privilegia o Estado em detrimento do contribuinte. “O objetivo é regular a relação entre o Fisco e o pagador de imposto para dar mais estabilidade, segurança jurídica e coibir qualquer tipo de abuso por parte das receitas municipais, estaduais e federal”, afirma Rigoni.

Conforme o deputado, após a aprovação do requerimento de urgência, será feita uma audiência pública, além de diversas reuniões técnicas. A ideia é que a proposta seja votada no plenário da Câmara Federal até o fim deste semestre legislativo, em meados de julho.

Entre os pontos de destaque do projeto, está a não obrigatoriedade de pagamento imediato de qualquer autuação e o imediato exercício do direito de defesa. O texto prevê medidas, como a necessidade de emissão prévia de notificação autorizando o trabalho de fiscalização e a análise da defesa do contribuinte antes da autuação fiscal.

"Ao invés de multar o contribuinte de uma vez, o Fisco precisará primeiro notificar para depois fazer a autuação. Terá ainda que esperar o tempo para a defesa prévia, analisar a defesa prévia etc. Ou seja, passar por todo um processo de julgamento como há em qualquer área do direito e que ainda não se vê na tributária”, explica o deputado.

Como exemplo de abusos que o Código pretende coibir ele cita casos como o da Receita dar uma multa de cerca de R$ 100 mil para uma empresa com um prazo de 12 horas para pagar e caso isso não se cumpra, o CNPJ é cancelado ou a inscrição estadual suspensa. "Não há tempo para a pessoa arruma dinheiro ou contestar o que foi feito", critica.

A proposta também estabelece que a existência de um processo tributário pendente, seja administrativo ou judicial, não deve impedir o acesso do contribuinte a incentivos fiscais, crédito oficial e participação em licitações.

O texto em análise da Câmara também define regras para os casos em que o contribuinte é parte subsidiária ou solidária à cobrança de um tributo. Conforme a proposta, o mero pertencimento a um mesmo grupo econômico não suscita a solidariedade tributária do contribuinte. Além disso, veda a caracterização de confusão patrimonial (entre sócio e empresa) por presunção e torna subsidiária a responsabilidade de terceiro (como um gerente de empresa ou inventariante) em relação à obrigação tributária de um contribuinte. Também proíbe a inclusão unilateral pela Fazenda Pública de sócios, empregados ou assessores técnicos (como contadores) da pessoa jurídica em lançamento tributário ou na certidão de dívida ativa sem prévia comprovação de dolo.
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Em seu site, a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Unafisco Nacional) se posicionou de maneira contrária à iniciativa, apelidada pela entidade de "Código de Defesa do Sonegador".

Conforme a publicação, o presidente da Unafisco Nacional, Mauro Silva, se reuniu com o relator do projeto, deputado Pedro Paulo (PSD/RJ), e compartilhou alguns pontos que considera críticos. Entre eles, a reparação de danos patrimoniais e morais decorrentes de atos praticados por servidor público sem a estrita observância da legislação tributária; a criação de novos critérios para responsabilização solidária, dificultando a responsabilização de sócios como solidários e exigindo prévia comprovação judicial ou administrativa de dolo, fraude ou simulação e a retirada de exigência da Certidão Negativa de Débitos (CND) para contratação com ente público.

“A entidade espera que o regime de urgência não atropele sua tramitação e que a matéria não seja votada antes destas discussões”, alerta a publicação.

Projeto de Lei visa combater insegurança jurídica ao contribuinte

Além da alta carga tributária, o Brasil é conhecido por contar com um sistema legal complexo, o que, muitas vezes, reverte em insegurança jurídica ao contribuinte. Desde a data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988, foram editadas cerca de 6,7 milhões de normas. Dessas, mais de 443 mil referem-se a regras tributárias, o que significa 37 normas tributárias editadas por dia ou 1,5 norma tributária por hora desde aquele período.

Os dados fazem parte de estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) divulgado no ano passado e ajudam a demonstrar o tamanho do desafio de quem necessita acompanhar a legislação de tributos do País.

A implementação de um Código de Defesa do Contribuinte, por sua vez, é visto como um artifício válido para promover um ambiente de confiança na relação entre o Fisco e os contribuintes, deixando mais claro o que é de direito das pessoas físicas ou jurídicas que pagam os impostos, a exemplo do que ocorreu com o Código de Defesa do Consumidor, promulgado em 1990.

O presidente executivo do IBPT, João Eloi Olenike, torce pelo avanço do PLP no Congresso Federal, embora não perceba vontade política para que isso ocorra. "Esse projeto de lei não é o primeiro a tratar do assunto. Achamos difícil de ser aprovado, porque não vemos uma vontade política do governo para que esse código seja criado", avalia Olenike.

O pessimismo de Olenike é exemplificado com uma outra lei, sancionada em 2010, e que teve pouco efeito prático desde então: o Dia Nacional do Respeito ao Contribuinte. A data cívica prevê que - todo o dia 25 de maio - órgãos públicos responsáveis pela fiscalização e pela arrecadação de tributos e contribuições promovam, em todas as cidades onde possuírem sede, campanhas de conscientização sobre os direitos e deveres dos contribuintes. “Se não cumprem nem o que está previsto nesse dia, achamos difícil que o código saia”, critica.

Autor do projeto, o deputado Felipe Rigoni, porém, garante que a proposta vem sendo muito bem aceita por diferentes partidos, além de contar com o apoio de associações comerciais. A autoria é compartilhada com parlamentares do PSD, MDB, PSDB, PSB e Novo como forma de externar força política.

O texto possui 37 artigos e se inspira na Tax Payer Bill of Rights, a Declaração de Direitos do Contribuinte dos Estados Unidos. 

Projeto pode facilitar atuação do contador

O contador e conselheiro do Conselho Regional de Contabilidade do Rio Grande do Sul (CRCRS) Felipe da Rocha Paesi vê como positiva as medidas em torno do PLP 17/2022 e acredita que o próprio trabalho do contador poderá ser beneficiado a partir dele.

“Os direitos e garantias estabelecidos aos contribuintes certamente facilitarão os trabalhos dos contabilistas, simplificando a sua atuação, e permitindo a resolução de muitas demandas e situações antes mesmo da instauração de processos administrativos ou judiciais”, afirma.

Na avaliação do contador, o próprio Fisco poderá se beneficiar com a proposta, visto que o objetivo é promover uma melhor dinâmica de relações com o contribuinte. “Trará equilíbrio entre as partes, com respaldo legal e haverá a possibilidade de instruir novos caminhos e rumos para a instrução mais favorável aos processos de fiscalização”, analisa.

Paesi destaca ainda que o projeto de lei prevê a utilização da arbitragem para a resolução de controvérsias tributárias, sendo que a sentença arbitral será vinculante e produzirá os mesmos efeitos que a decisão judicial.

O texto altera ainda algumas regras previstas no Código Tributário Nacional. Determina, por exemplo, que a ação para a cobrança de tributo prescreverá em três anos, e não em cinco, como é hoje.

“O PLP 17/2022 normatiza e inova ao trazer uma maior paridade no trato entre a fiscalização e os contribuintes, complementando situações e incluindo soluções para os casos que haja o desfavor deste último”, afirma.

O que muda com o projeto de lei

Marco de instituição de taxas e impostos: um estudo prévio deverá ser obrigatoriamente apresentado pelo Estado para a criação de impostos e taxas.

Autuação pela Receita depende de defesa prévia: cancelamento de CNPJ de empresas, por exemplo, ocorrerá somente após o fim de um processo que deverá ouvir todas as partes.
Proporcionalidade tributária: a responsabilidade tributária de ser inadimplente a um tributo será proporcional à participação na situação que gerou o tributo. Além disso, pertencer a um grupo econômico não implicará em imediata solidariedade tributária.

Responsabilidade solidária: Com o novo Código, para a Receita poder cobrar de um subsidiário de uma empresa, ela, primeiro, precisará constatar que o primeiro sócio inadimplente estava na impossibilidade de pagar.

Impedimento de acesso ao crédito e benefícios fiscais: empreendedor não poderá ser impedido de ganhar benefícios e incentivos fiscais, como participar de licitações e receber linhas de crédito, em razão de algum questionamento na justiça ou na Fazenda Pública.

Crédito tributário reajustado pela Selic: O crédito do contribuinte será reajustado pela taxa básica de juros e não pela poupança, da mesma maneira que os impostos não pagos são reajustados pela Selic.

Responsabilidade do servidor da Fazenda: O servidor da Receita que realizar alguma forma de abuso ao contribuinte poderá ser punido.

Fonte: Jornal do Comércio, 31/05/2022.
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