25.03

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Direito Tributário

Empresas perdem em São Paulo disputa sobre créditos de ICMS

Por Adriana Aguiar

Grandes empresas que compraram produtos da Zona Franca de Manaus terão agora que discutir o cancelamento de créditos de ICMS pelo governo paulista na Justiça. Ontem, a Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) de São Paulo - última instância da esfera administrativa -, por nove votos a sete, considerou legais as autuações fiscais lavradas pela fiscalização.

O tema foi analisado na chamada “sessão temática”, responsável por unificar o entendimento do tribunal administrativo. A tese firmada agora será aplicada a todos os demais casos sobre o assunto levados ao TIT.

A corrente vencedora entendeu que não se pode permitir o uso de créditos de benefícios fiscais não autorizados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), conforme preveem os artigos 1º e 8º da Lei Complementar nº 24, de 1975.

Para os juízes, não seria possível aplicar ao caso o artigo 15 da mesma norma, como defendem os contribuintes. O dispositivo afirma expressamente que a medida não se aplica às indústrias instaladas ou que vierem a instalar-se na Zona Franca de Manaus. Os julgadores levaram em consideração que essa determinação é anterior à Constituição Federal de de 1988 e, depois, vieram novas regras contra a guerra fiscal de ICMS, que proíbem a concessão de créditos não permitidos pelo Confaz.

O impacto econômico da discussão também foi levado em consideração. O juiz Rodrigo Pansanato Osada destacou, em seu voto, que estaria em jogo, segundo informações da Fazenda do Estado de São Paulo, cerca de R$ 9 bilhões em créditos.

Alguns juízes também consideraram que o tema julgado ontem estaria vinculado ao entendimento da Câmara Superior, adotado no ano passado, pela legalidade da anulação (glosa) de créditos sobre benefícios fiscais não aprovados pelo Confaz - discussão que não incluiu a Zona Franca.

A corrente que ficou vencida mantinha a aplicação do artigo 15 da Lei Complementar nº 24, de 1975, que traz a exceção para a Zona Franca de Manaus. O juiz Juliano Di Pietro, por exemplo, afirmou que o artigo é totalmente compatível com a Constituição e não possui qualquer limite temporal.

Ele acrescentou que o espírito constitucional é de estímulo da região Amazônica. E que isso já foi confirmado no Supremo Tribunal Federal (STF), em repercussão geral, em abril de 2019, ao tratar do direito aos créditos de IPI na entrada de insumos, matéria-prima e material de embalagem adquiridos na Zona Franca de Manaus sob o regime da isenção (RE 592891).

Contudo, a corrente favorável à tese dos contribuintes ficou vencida. O tema deve afetar principalmente as montadoras de veículos, indústrias de eletrônicos, refrigerantes e cosméticos. Com a decisão, segundo o advogado Thiago Amaral, “qual seria a vantagem hoje de comprar na Zona Franca de Manaus?”

Além dos milhões de reais envolvidos nos autos de infração aplicados aos contribuintes, de acordo com advogados, as empresas agora terão o custo de levar a discussão para o Judiciário, onde precisarão apresentar garantias. Contudo, afirmam, a Justiça tende a ser mais favorável às empresas nessa discussão.

Para o advogado Maurício Barros, tanto o legislador quanto o Supremo tem adotado uma linha de proteção máxima à Zona Franca. Tanto que depois da promulgação da Constituição, acrescenta, foram editadas duas emendas constitucionais (nº 42, de 2003, e nº 83, de 2014), que a mantém em vigor até 2073.

Segundo o advogado tributarista Mauricio de Carvalho Silveira Bueno, agora a questão deve seguir o mesmo caminho da discussão sobre créditos de IPI. Após sucessivas derrotas dos contribuintes no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), houve a manifestação do STF sobre a distinção da Zona Franca em relação aos demais Estados.

O julgamento do TIT, afirma o advogado, tratou o artigo 15 da Lei Complementar nº 24 “quase como letra morta, ainda que o Supremo não tenha declarado o dispositivo inconstitucional”. Ele lembra que o artigo 28 da Lei nº 13.457/2009, de São Paulo, que trata do processo administrativo tributário, é claro ao dizer que, em julgamento, é vedado afastar a aplicação de lei sob alegação de inconstitucionalidade, exceto quando o STF a tiver proclamado. “Agora teremos uma enxurrada de processos milionários no Judiciário paulista”, diz.

Apesar de haver precedente favorável sobre IPI no STF, o advogado Paulo Vieira da Rocha alerta que tem ocorrido uma certa flexibilização em casos recentes julgados pelos ministros. No mês passado, diz, o Pleno Virtual declarou constitucionais incentivos concedidos pelas Leis nº 8.387, de 1991, e nº 10.167, de 2001, ao setor de informática, independentemente de estarem localizados na Zona Franca (ADI 2399). Em outro julgamento, de agosto de 2020, acrescenta, os ministros trataram da incidência de PIS e Cofins na revenda de veículos e autopeças de concessionárias localizadas na região e “parece ter havido alguma flexibilização, pelo menos segundo uma das duas interpretações que se podem tirar daquele difícil acórdão” (ADI 4254).

Em nota, a Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo afirma que a decisão da Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas atinge 47 processos do contencioso administrativo paulista, cujo débito exigido originalmente pelos lançamentos em autos de infração supera R$ 2 bilhões.

Foram pautados e julgados cinco processos, de acordo com a nota. “As acusações fiscais restaram mantidas, tendo prevalecido, por maioria de votos (9 x 7), o entendimento pela legitimidade da exigência fiscal em autos de infração, considerando indevidos os creditamentos efetuados pelos adquirentes paulistas em face da ausência de convênio Confaz na concessão de incentivos aos respectivos remetentes manauaras”, diz a Fazenda paulista.

Fonte: Valor Econômico, 25/03/2022.
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