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Direito Tributário

Maioria no STF afasta cobrança de imposto de renda sobre juros de mora

Por Beatriz Olivon

O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de repercussão geral, afastou a incidência do Imposto de Renda (IR) sobre os juros devidos pelo atraso no pagamento de remuneração a trabalhadores. A decisão animou os advogados tributaristas em tempos de derrotas na Corte. Eles destacam que este mesmo raciocínio se aplica a outras discussões sobre tributação de juros, que podem beneficiar, inclusive, quem obteve o direito de excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins.

A incidência de IR sobre juros dividia a doutrina e a jurisprudência. No caso julgado na sexta-feira pelo Plenário Virtual do STF, a União recorreu de decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, sediado em Porto Alegre, que afastou a incidência de IR sobre juros de mora acrescidos a verbas em ação judicial. Para o TRF, os juros são indenização pelo prejuízo resultante de um “atraso culposo” no pagamento de parcelas.

A União alega que o fato de uma verba ter natureza indenizatória, por si só, não significa que o recebimento não represente acréscimo patrimonial. Já o servidor argumenta que o IR não pode incidir sobre juros de mora decorrentes de condenações judiciais porque elas não acarretam acréscimo patrimonial, apenas se destinam a reparar danos.

Para uma corrente da doutrina, o simples fato de uma verba ter natureza indenizatória já afasta a incidência do imposto. Para outra, isso só acontece quando a verba indenizatória recompõe uma perda patrimonial. Nesse caso, o ingresso no patrimônio não representaria riqueza nova, mas restituição de parte do que já existia e foi desfalcado em razão de um ilícito.

Prevaleceu, no STF, o voto do relator, ministro Dias Toffoli, para quem os valores relativos a lucros cessantes (o que a pessoa deixa de ganhar) podem ser tributados pelo IR, mas não os relativos a danos emergentes (perda efetiva). No caso, ele entende que se trata de recomposição de perdas, sem levar a aumento de patrimônio.

O ministro considerou que o atraso no pagamento de salário gera danos para o credor, que pode precisar de empréstimos para pagar suas despesas mensais, o que pode levar ao pagamento de juros, multas e até inscrição em cadastro de inadimplentes. “Os juros de mora legais visam, em meu entendimento, recompor, de modo estimado, esses gastos a mais que o credor precisa suportar (...) em razão do atraso no pagamento da verba de natureza alimentar a que tinha direito.”

Ainda segundo Toffoli, para ser aceita a ideia de que os juros de mora seriam lucros cessantes, seria necessário pressupor que o credor (no caso, o trabalhador) normalmente aplicaria toda a verba não recebida em algum investimento que rendesse valor equivalente. O único voto divergente foi do ministro Gilmar Mendes.

Apesar das referências ao pedido trabalhista no voto do relator, advogados tributaristas entendem que o mesmo raciocínio se aplica a outras teses, em que a natureza da verba é igualmente discutida.

A natureza jurídica dos juros de mora também é o pano de fundo no Tema 962, por exemplo, em que o STF vai definir se incidem IRPJ e CSLL sobre a Selic recebida pelo contribuinte em ação de repetição de indébito, proposta quando se paga tributo a mais, por exemplo, segundo o advogado Fabio Brun Goldschmidt, do escritório Andrade Maia. O caso também é de relatoria do ministro Dias Toffoli.

Pode ser a situação de quem pagou o PIS e a Cofins com o ICMS no cálculo. Mas, em 2017, o STF exclui o imposto estadual desta conta. Brun reforça que se as empresas têm prejuízo financeiro, também têm que buscar empréstimos, perdem negócios. O advogado também participa do julgamento no STF representando a Federação Nacional dos Auditores Tributários.

O Tema 962 ganhou destaque, segundo o advogado Rafael Nichele, sócio do escritório Nichele Advogados Associados, porque muitos contribuintes ao invés de pedir a compensação do PIS e da Cofins sem o ICMS, devem pedir a devolução do que foi pago a mais por meio de ações de repetição de indébito e, esses valores são corrigidos pela taxa básica de juros Selic.

Segundo o advogado Flávio Eduardo Carvalho, sócio do escritório Schneider, Pugliese Advogados, embora o relator aponte que está julgando uma demanda de pessoa física em relação trabalhista, o raciocínio se assemelha à situação de descumprimento contratual, por exemplo, em que uma empresa vende uma mercadoria e o comprador fica inadimplente. Na quitação incide juros de mora, para reparar o tempo esperado pela empresa para receber o dinheiro.

Há também a discussão sobre atualização de depósito judicial, segundo o advogado. Ele afirma que a Selic é um misto de juros e atualização monetária e o relator no STF menciona que, em muitos casos, não se identifica muito bem qual é a parte da reparação e, na dúvida, o ideal é afastar a tributação (RE 855.091).

Fonte: Valor Econômico, 14/03/2021.
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