08.01

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Imobiliário

Dos requisitos e do procedimento de adjudicação compulsória extrajudicial

por Thomaz Pereira Duarte

Com a entrada em vigor da Lei n° 14.382/2022, foi acrescida à Lei de Registros Públicos a possibilidade da realização da adjudicação compulsória na modalidade extrajudicial[1]. Trata-se de um procedimento que permite a transferência da propriedade de um imóvel em caso do vendedor não cumprir suas obrigações contratuais e não realizar a transferência do bem ao adquirente que está em dia com as suas obrigações. A adjudicação teria lugar para suprir a vontade e a conduta do devedor, substituindo-a por uma declaração estatal (antes somente do Poder Judiciário e que passa a ser estendida ao Oficial do Registro de Imóveis) para que sejam possíveis o registro e a transferência definitiva da propriedade do imóvel negociado entre as partes em favor do adquirente que está em dia com as suas obrigações contratuais.

São legitimados a requerer a adjudicação o promitente comprador, seus cessionários ou promitentes cessionários ou, ainda, seus sucessores, bem como o promitente vendedor, desde que estejam munidos do instrumento jurídico correspondente (promessa de compra e venda, cessão ou comprovante de sucessão); prova do inadimplemento e da não celebração do título de transmissão de propriedade (dentro do prazo estabelecido após a notificação extrajudicial para dirimir tal falta); ata notarial lavrada com a identificação do imóvel, descrição do número da matrícula ou da transcrição, descrição do imóvel e eventuais ônus ou gravames, qualificação das partes, identificação dos atos ou negócios jurídicos que lhe servem de fundamento, prova do pagamento do preço ou cumprimento da contraprestação estabelecida, a caracterização do inadimplemento da obrigação de outorgar/receber o título de propriedade, valor venal do imóvel, certidões de inexistência de ação judicial envolvendo o contrato; comprovante de pagamento do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e a constituição de advogado com procuração com poderes específicos.
 
Em setembro de 2023, a Corregedoria Nacional de Justiça publicou o Provimento n° 150/2023, que estabelece as diretrizes para regulamentação do procedimento da adjudicação compulsória extrajudicial. O procedimento deverá ser realizado na circunscrição responsável pelo registro da atual situação do imóvel. Neste Provimento, está estabelecido que a adjudicação compulsória pode ser fundamentada por “[...] quaisquer atos ou negócios jurídicos que impliquem promessa de compra e venda ou promessa de permuta, bem como as relativas a cessões ou promessas de cessão, contanto que não haja direito de arrependimento exercitável”. Além disso, há possibilidade de adoção do procedimento nos casos em que o devedor é falecido ou está declarada a sua ausência, exista incapacidade civil ou extinta a pessoa jurídica.
 
Em síntese, o procedimento extrajudicial estabelecido tem início com requerimento apresentado ao Oficial do Registro de Imóveis, passando pela notificação do requerido (ou seus herdeiros/inventariante no caso de já ser falecido), por correspondência com Aviso de Recebimento, para se manifestar (anuir ou impugnar) no prazo de quinze dias úteis. O silêncio do requerido poderá ser interpretado como anuência. Após nova possibilidade de manifestação do requerente, o Oficial proferirá sua decisão. É admitida a conciliação ou a mediação, conforme faculdade do Oficial do Registro de Imóveis. Da decisão do Oficial do Registro de Imóveis cabe recurso a ser interposto no prazo de dez dias úteis que será encaminhado ao Poder Judiciário para que aprecie a impugnação (acolhida ou rejeitada pelo Oficial do Registro de Imóveis). Eventual outra exigência apresentada no curso do procedimento poderá ser objeto de dúvida, já conhecida na Lei Registral.
 
Por fim, importante salientar que Provimento n° 150/2023 editado pela Corregedoria Nacional de Justiça estabelece que os direitos reais, ônus e gravames que não impeçam atos de disposição voluntária da propriedade[1] não obstam a adjudicação compulsória, tampouco eventual indisponibilidade do bem impede o processo extrajudicial, mas ensejará o indeferimento caso não seja cancelada até o momento da decisão final do Oficial de Registro de Imóveis. Também estabelece que não é condição para o deferimento e registro a comprovação da regularidade fiscal do transmitente, tampouco há necessidade de prova prévia do pagamento das cotas de despesas comuns em casos envolvendo unidades autônomas estabelecidas em condomínios edilícios. Admite-se, também, a adjudicação de bem da massa falida ou da recuperanda, desde que o ato ou o negócio jurídico seja anterior ao reconhecimento judicial da falência, ressalvados os casos passíveis de reconhecimento de ineficácia ou revogação estabelecido nos artigos 129 e 130 da Lei n° 11.101/2005[2].

Cabe salientar que a adoção desse tipo de expediente administrativo tende a ser mais simples, ágil e também menos oneroso do que a propositura de uma ação judicial e foi estabelecida pelo Legislador, em conjunto com outras medidas que vêm sendo adotadas, com a finalidade de desafogar o Poder Judiciário, facilitando a regularização imobiliária e desjudicializando o expediente que passa a ser conduzido internamente perante o Registro de Imóveis competente sem que isso acarrete diminuição da segurança jurídica à população.


[1] Art. 216-B da Lei 6.015/73. Sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão poderá ser efetivada extrajudicialmente no serviço de registro de imóveis da situação do imóvel, nos termos deste artigo.
§ 1º São legitimados a requerer a adjudicação o promitente comprador ou qualquer dos seus cessionários ou promitentes cessionários, ou seus sucessores, bem como o promitente vendedor, representados por advogado, e o pedido deverá ser instruído com os seguintes documentos:
I - instrumento de promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão, quando for o caso;
II - prova do inadimplemento, caracterizado pela não celebração do título de transmissão da propriedade plena no prazo de 15 (quinze) dias, contado da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel, que poderá delegar a diligência ao oficial do registro de títulos e documentos;
III - ata notarial lavrada por tabelião de notas da qual constem a identificação do imóvel, o nome e a qualificação do promitente comprador ou de seus sucessores constantes do contrato de promessa, a prova do pagamento do respectivo preço e da caracterização do inadimplemento da obrigação de outorgar ou receber o título de propriedade;
IV - certidões dos distribuidores forenses da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto da adjudicação;
V - comprovante de pagamento do respectivo Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI);
VI - procuração com poderes específicos.
§ 2º O deferimento da adjudicação independe de prévio registro dos instrumentos de promessa de compra e venda ou de cessão e da comprovação da regularidade fiscal do promitente vendedor.
§ 3º À vista dos documentos a que se refere o § 1º deste artigo, o oficial do registro de imóveis da circunscrição onde se situa o imóvel procederá ao registro do domínio em nome do promitente comprador, servindo de título a respectiva promessa de compra e venda ou de cessão ou o instrumento que comprove a sucessão.
[2] Por exemplo, inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade.
[3] Art. 129. São ineficazes em relação à massa falida, tenha ou não o contratante conhecimento do estado de crise econômico-financeira do devedor, seja ou não intenção deste fraudar credores:
I – o pagamento de dívidas não vencidas realizado pelo devedor dentro do termo legal, por qualquer meio extintivo do direito de crédito, ainda que pelo desconto do próprio título;
II – o pagamento de dívidas vencidas e exigíveis realizado dentro do termo legal, por qualquer forma que não seja a prevista pelo contrato;
III – a constituição de direito real de garantia, inclusive a retenção, dentro do termo legal, tratando-se de dívida contraída anteriormente; se os bens dados em hipoteca forem objeto de outras posteriores, a massa falida receberá a parte que devia caber ao credor da hipoteca revogada;
IV – a prática de atos a título gratuito, desde 2 (dois) anos antes da decretação da falência;
V – a renúncia à herança ou a legado, até 2 (dois) anos antes da decretação da falência;
VI – a venda ou transferência de estabelecimento feita sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado ao devedor bens suficientes para solver o seu passivo, salvo se, no prazo de 30 (trinta) dias, não houver oposição dos credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do registro de títulos e documentos;

 
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