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BC facilita transferência internacional entre pessoas

Por Estevão Taiar e Álvaro Campos

O Banco Central anunciou uma série de mudanças para facilitar as transferências internacionais entre pessoas físicas. Entre elas, está a permissão para que sejam realizadas, por meio de cartões de crédito, remessas de recursos para o exterior ou vindas de lá. A autoridade monetária também permitirá que instituições de pagamentos operem no mercado de câmbio. A maior parte das medidas entra em vigor em outubro.

Em entrevista coletiva, o chefe de subunidade do departamento de regulação prudencial e cambial do BC, Lucio Holanda Oliveira, afirmou que o oferecimento dos serviços de transferência via cartão de crédito “dependerá do interesse dos emissores” desses cartões. Na prática, a transferência realizada por um brasileiro para uma pessoa no exterior aparecerá como uma compra na fatura do cartão de quem enviou. Já quem recebeu terá os recursos creditados automaticamente em sua conta.

A mesma operação funcionará em sentido oposto, mas nesse caso será necessário que o cartão a partir do qual foram enviados os recursos esteja vinculado a uma conta no Brasil. A taxa de câmbio cobrada será a do dia da operação, e deverá ser informada ao cliente.

Segundo Oliveira, “em tese poderá ser cobrada alguma tarifa pelo serviço”, mas o BC acredita que “a própria competição terá um efeito” de diminuir essas tarifas. De acordo com ele, a tendência é que, nas operações via cartão de crédito, sejam remetidos mais recursos para o Brasil do que transferidos para o exterior.

Na avaliação do BC, a medida facilitará principalmente as transferências de até US$ 10 mil - que respondem por 99,8% das operações entre pessoas em diferentes países e 87,9% do valor dessas operações. Mas, além de tornar mais fáceis essas remessas, com as medidas o BC também planeja aumentar a competição, diminuir os custos no mercado cambial e facilitar a atuação de exportadores.

Outra mudança importante foi, por exemplo, a permissão para que instituições de pagamento atuem no mercado de câmbio, desde que exclusivamente por meio eletrônico, sem oferecer recursos em espécie. Instituições de pagamentos são aquelas que permitem a movimentação de recursos, mas não concedem empréstimos e financiamentos. Segundo a autoridade monetária, diversas fintechs que oferecem contas digitais se enquadram na categoria e poderão oferecer serviços de câmbio diretamente aos próprios clientes. Essa é a única alteração que só valerá a partir de 1º de setembro do ano que vem.

O BC também anunciou que instituições com permissão para operar no mercado de câmbio poderão usar contas em moeda estrangeira mantidas no exterior para liquidar operações cambiais. Entram nessa categoria corretoras, distribuidoras e as próprias instituições de pagamento. Antes, essa opção era restrita aos bancos.

Para as corretoras, isso era um pleito antigo. Foram quase oito anos para o BC regulamentar a lei 12.865, de 2013, e elas poderem ter suas próprias contas correntes em moeda estrangeira (CCME). No modelo atual, sempre que uma corretora vai realizar uma transferência para o exterior, precisa antes passar por um banco brasileiro que tenha uma CCME, o que encarece e torna o processo mais lento.

Kelly Massaro, presidente-executiva da Associação Brasileira de Câmbio (Abracam), afirma que poucos bancos oferecem esse serviço de CCME para as corretoras, o que acaba dificultando uma maior competição de preço e até mesmo gerando um risco sistêmico, já que os volumes são muito concentrados e, se uma dessas instituições tiver algum problema, o mercado terá dificuldade de se adaptar.

“Oferecer uma CCME não dá muita rentabilidade e gera um custo de compliance muito grande, pois, como a operação está passando pelo banco, ele também é responsável. Assim, os grandes bancos não têm interesse em prestar esse serviço. Essa era uma demanda antiga e vai trazer um ganho muito grande, colocando todas as instituições financeiras nas mesmas condições”, diz.

O Valor apurou que, em cada transação internacional, os bancos brasileiros que oferecem a CCME pagam em torno de US$ 5 para suas contrapartes internacionais, mas cobram em torno de US$ 20 das corretoras locais. Ou seja, existira um spread de quase US$ 15 que poderia, em tese, desaparecer, agora que as corretoras poderão ter suas próprias CCME. Além disso, ao ofertar também esse serviço, as corretoras esperam conquistar mais clientes ao ampliar a oferta de produtos correlacionados.

Até pela complexidade do compliance, somente as grandes corretoras devem conseguir de fato abrir uma CCME, já que para isso precisarão encontrar um banco parceiro lá fora que aceite ser a contraparte da operação. Em 2019, a Abracam fez um acordo com a National Automated Clearing House Association (Nacha) que facilitava o processo de abertura de CCMEs pelos bancos e, agora, poderá ser aproveitado também pelas corretoras.

Apesar das mudanças e da maior abertura do BC, na prática as instituições de pagamento podem ter dificuldades para encontrar contrapartes no exterior para suas operações de câmbio. “Qual banco estrangeiro vai querer abrir conta para uma fintech desconhecida aqui no Brasil? O risco não compensa, porque os bancos são corresponsáveis pela operação e, se a fintech fizer alguma besteira, quem será punido e tomará uma multa do Federal Reserve [Fed, o banco central dos EUA] é o banco”, diz um executivo de um banco de câmbio.

Por fim, o BC consolidou uma série de regras para pagamentos eletrônicos internacionais. O objetivo é eliminar assimetrias para empresas que viabilizam pagamentos de comércio eletrônico, assinaturas de serviços de música e compras de jogos de internet, por exemplo. Atualmente, essas companhias, chamadas de “facilitadoras de pagamentos”, precisam realizar uma operação de câmbio todas as vezes em que alguém usa os seus serviços. Com as mudanças, elas poderão realizar uma única operação “pelo valor agregado”.

Fonte: Valor Econômico, 10/09/2021.
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