24.08

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Direito Tributário

Brasil quer taxação a múltis superior a 15% e partilha melhor

Por Assis Moreira

O Brasil avalia que a maior revisão do sistema tributário internacional em um século resultará em ganho bastante modesto para o país, considerando as bases atuais do acordo em negociação. Por isso, juntou força com outros emergentes na defesa de taxa mínima global acima de 15% sobre as multinacionais e melhora na fatia a ser partilhada entre os países.

É o que diz a Receita Federal em resposta a requerimento de informações da Câmara dos Deputados. Pela primeira vez o governo apresenta claramente a posição nessa negociação que mais de 130 países esperam concluir até o fim do ano sob a coordenação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

A resposta da Receita Federal ocorreu depois de demanda formulada pelo deputado João Maia (PL-RN), autor de proposta de criação da Cide-Digital, um tributo sobre o faturamento de grandes empresas de tecnologia.

A Receita diz que na negociação o Brasil “tem defendido uma solução de consenso que contemple também as necessidades dos países em desenvolvimento, especialmente no contexto da crise global trazida pela pandemia e suas consequências fiscais, para assegurar maior participação desses países na tributação dos lucros das maiores e mais lucrativas empresas, que obtém resultados significativos nos mercados desses países, ainda que sem presença física”.

Em julho, quando os ministros de Finanças do G-20 aprovaram os parâmetros do acordo global, fontes da OCDE estimaram que o Brasil poderia ter arrecadação adicional entre US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões (R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões) por ano com a obrigação de companhias multinacionais pagarem mais imposto. Em comparação, a ONG Tax Justice Network calcula que o Brasil perde US$ 14,6 bilhões por ano (R$ 79,5 bilhões) com a otimização fiscal de múltis, sendo o terceiro maior perdedor do mundo nesse caso.

O novo acordo terá dois pilares. O Pilar 1 visa garantir uma repartição mais equitativa dos lucros e dos direitos de imposição entre países atingindo as cem maiores multinacionais, incluindo as grandes do setor digital como Google, Facebook e Amazon. Serão alvejadas as múltis com faturamento mundial superior a € 20 bilhões e margem de lucro acima de 10%.

Para a Receita Federal, o impacto econômico desse pilar ainda não está claro, porque há elementos a serem definidos. Por exemplo, a parcela de lucro residual a ser destinada aos países de mercado e as medidas de simplificação (“safe harbour”).

Sua conclusão é de que no Pilar 1 os resultados de arrecadação tributária esperados, nos termos propostos pelas maiores nações industrializadas, que formam o G-7, “seriam limitados e não atenderiam as expectativas dos países em desenvolvimento”. Por isso, informa que o Brasil, em conjunto com outros países, busca alcançar resultados globalmente mais equilibrados, propondo uma fatia maior dos lucros de múltis a ser taxado nos países de mercado. Também quer que o acordo alcance um número mais amplo de múltis, não só as cem atuais na lista da OCDE.

Quanto ao Pilar 2, cria um imposto mínimo mundial de pelo menos 15% que os países poderão cobrar para proteger suas bases de imposição. Significa que a matriz da múlti pagará um imposto suplementar sobre uma receita que pagou pouca taxação com otimização fiscal e transferência de lucros para paraísos fiscais.

O Brasil apoia a tributação mínima, mas defende uma alíquota maior de 15% “para assegurar um ambiente de negócio mais justo, na competição entre empresas ou na busca de países pela atração de investimentos, com um nível adequado de arrecadação tributária para todos os países’’.

Segundo a OCDE, o imposto global mínimo de 15% poderá gerar receita adicional de US$ 150 bilhões por ano aos países. No entanto, a Receita nota que a projeção não considera regras de tributação existentes nos diferentes países.

Exemplifica que a regra brasileira de tributação de controladas, na Lei 12.973, de 13 de maio de 2014, já tem elementos da proposta discutida na OCDE e “por isso entendemos que o país não terá ganhos arrecadatórios significativos”.

Avalia também que a regra brasileira pega mais empresas do que a proposta da OCDE. Ou seja, alcança todas as controladoras que tenham subsidiárias ou coligadas no exterior, independentemente de sua posição na cadeia societária. Já na OCDE o acordo alcançará apenas as controladas finais de grupos econômicos e que tenham faturamento superior a € 750 milhões por ano.

A taxa de imposição efetiva mínima de “pelo menos 15%” afetaria entre 2.350 e 10 mil empresas globalmente, dependendo das barganhas, segundo fontes em Paris. E são excluídas empresas do setor extrativo (petróleo, gás, mineração) e de serviços financeiros.

Já a regra brasileira é mais rígida, pois não contém nenhuma forma de exclusão de renda de companhias situadas em países de baixa tributação (“carve-outs”) nem permite compensar lucros dessas controladas com prejuízos de outras subsidiárias (“blending”), diz a Receita. Assim, prevê que a alíquota do imposto mínimo global será possivelmente inferior à aplicada pela regra brasileira, se persistir a proposta em negociação.

De toda maneira, a posição brasileira é de que o acordo global resultará num ambiente tributário internacional “mais estável e previsível”, podendo reduzindo estratégias que exploram brechas nas regras fiscais.

Fonte: Valor Econômico, 23/08/2021.
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