09.12
Imprensa
Direito Tributário
Contribuinte perde no Carf tese sobre dedução de ágio do cálculo da CSLL
Por Beatriz Olivon
A Fazenda Nacional conseguiu formar maioria de votos na Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e vencer uma importante discussão sobre ágio: a que trata da dedução de valores relativos à amortização da base de cálculo da CSLL. Em julgamento ontem de autuação contra a Ambev, cinco dos oito conselheiros entenderam que que seria necessária previsão legal para autorizar o abatimento dessas despesas — o que poderia indicar mudança na jurisprudência.
O julgamento foi realizado na 1ª Turma da Câmara Superior, a última instância do Carf. Os conselheiros só discutiram esse ponto na sessão e, por maioria, mantiveram decisão anterior que cancelou parte de autuação de R$ 2 bilhões recebida pela Ambev. Não é possível saber o valor exato mantido, mas seria cerca de metade, segundo uma fonte.
Na autuação, a Receita Federal cobra Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL sobre amortização de ágio, referente ao período entre 2007 e 2012. O ágio é decorrente da incorporação da Beverage Associate Holding (BAH), para aquisição da argentina Quilmes.
Foi mantida pelos conselheiros parte da cobrança de tributos, mas a multa aplicada, de 150%, foi reduzida para 75%, como havia sido julgado anteriormente pela 1ª Turma da 2ª Câmara da 1ª Seção. Os conselheiros cancelaram montante referente ao ano de 2007 por perda de prazo para exigência dos valores (decadência).
Por uma questão processual, os recursos apresentados pela Ambev e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para discutir o mérito da amortização de ágio não foram aceitos pela 1ª Turma. O único ponto analisado pelos conselheiros foi o da tributação pela CSLL.
Na sessão, foram feitas sustentações orais pelas partes. O advogado da empresa, Roberto Quiroga, explicou que a Quilmes já estava inserida em uma holding e que a Ambev pediu para a fabricante argentina criar uma empresa veículo (a BAH), porque a holding existente era dos antigos proprietários. Em negócios internacionais, disse, é praxe não comprar uma holding existente para se evitar possíveis contingências.
“Essa não é uma operação tradicional de empresa veículo. Já existia uma holding que ela poderia comprar. A holding nova teve motivos extrafiscais”, afirmou. Por causa da CPMF e do IOF, acrescentou, a Ambev optou por fazer a operação no exterior e pagar dividendos lá fora para não ter que recolher esses tributos.
Para o procurador Rodrigo Moreira, representante da Fazenda Nacional, porém, não seria possível a turma analisar o propósito negocial da operação sem discutir outro argumento, que não chegou à 1ª Turma: a confusão patrimonial.
A discussão, porém, entre os conselheiros ficou concentrada na CSLL. A relatora, conselheira Livia de Carli Germano, representante dos contribuintes, ficou vencida no caso. Ela entendeu que as despesas de ágio são amortizáveis contabilmente, por não haver previsão para integrarem a base de cálculo da CSLL.
O voto foi seguido por dois conselheiros representantes dos contribuintes: Luis Henrique Marotti Toseli e Alexandre Evaristo Pinto. Os quatro representantes da Fazenda divergiram. Junto com eles votou o conselheiro Gustavo Guimarães Fonseca, representante dos contribuintes, formando maioria a favor da tributação.
A partir de setembro de 2019, com o voto de desempate favorável ao contribuintes, as empresas passaram a vencer as questões sobre CSLL na Câmara Superior, segundo o advogado e ex-conselheiro Caio Cesar Nader Quintella. Em geral, nos casos, representantes dos contribuintes votavam contra a tributação e os da Fazenda, a favor.
A questão analisada é se as regras de amortização de ágio do lucro real se aplicam à CSLL ou se não é possível, já que não haveria previsão legal para a sua inclusão na base de cálculo. Contribuintes costumam alegar que a regra específica de indedutibilidade das despesas de amortização contábil do ágio não se aplica à CSLL e que não há previsão legal que vede expressamente as deduções.
Já para a Receita, como não há previsão legal de exclusão da despesa de amortização com ágio da base de cálculo da CSLL, deve ser mantida, uma vez que a legislação determina que, para a apuração da base de cálculo da contribuição, deve ser observada a legislação aplicável ao IRPJ.
Quintella, que é ex-conselheiro do Carf, entende que a base de cálculo da CSLL é autônoma e legalmente delimitada por normas próprias, com identidade com a apuração do lucro real quando, expressamente, assim for determinado pela legislação.
No julgamento, o novo presidente do Carf, conselheiro Carlos Henrique de Oliveira, representante da Fazenda, afirmou que fica entre duas situações nesse tema por buscar sempre a essência e o conceito no seu raciocínio jurídico. “A questão aqui é se preciso de uma regra para incluir ou para excluir. Qual é a regra necessária?”, questionou.
Se a dedutibilidade do ágio não é uma despesa necessária, mas uma vantagem que o legislador outorga por interesses econômicos, afirmou, é necessário legislação específica. “A falta de uma legislação específica me faz deduzir que tenho que votar com a divergência”, disse o presidente do Carf.
Após o julgamento, o advogado da empresa informou que poderá levar a parte que perdeu à Justiça. Procurada pelo Valor, a Ambev afirmou que não comenta casos em andamento. A PGFN não pretende recorrer, segundo o procurador que atuou no caso.
Fonte: Valor Econômico, 12/07/2022.
A Fazenda Nacional conseguiu formar maioria de votos na Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e vencer uma importante discussão sobre ágio: a que trata da dedução de valores relativos à amortização da base de cálculo da CSLL. Em julgamento ontem de autuação contra a Ambev, cinco dos oito conselheiros entenderam que que seria necessária previsão legal para autorizar o abatimento dessas despesas — o que poderia indicar mudança na jurisprudência.
O julgamento foi realizado na 1ª Turma da Câmara Superior, a última instância do Carf. Os conselheiros só discutiram esse ponto na sessão e, por maioria, mantiveram decisão anterior que cancelou parte de autuação de R$ 2 bilhões recebida pela Ambev. Não é possível saber o valor exato mantido, mas seria cerca de metade, segundo uma fonte.
Na autuação, a Receita Federal cobra Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL sobre amortização de ágio, referente ao período entre 2007 e 2012. O ágio é decorrente da incorporação da Beverage Associate Holding (BAH), para aquisição da argentina Quilmes.
Foi mantida pelos conselheiros parte da cobrança de tributos, mas a multa aplicada, de 150%, foi reduzida para 75%, como havia sido julgado anteriormente pela 1ª Turma da 2ª Câmara da 1ª Seção. Os conselheiros cancelaram montante referente ao ano de 2007 por perda de prazo para exigência dos valores (decadência).
Por uma questão processual, os recursos apresentados pela Ambev e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para discutir o mérito da amortização de ágio não foram aceitos pela 1ª Turma. O único ponto analisado pelos conselheiros foi o da tributação pela CSLL.
Na sessão, foram feitas sustentações orais pelas partes. O advogado da empresa, Roberto Quiroga, explicou que a Quilmes já estava inserida em uma holding e que a Ambev pediu para a fabricante argentina criar uma empresa veículo (a BAH), porque a holding existente era dos antigos proprietários. Em negócios internacionais, disse, é praxe não comprar uma holding existente para se evitar possíveis contingências.
“Essa não é uma operação tradicional de empresa veículo. Já existia uma holding que ela poderia comprar. A holding nova teve motivos extrafiscais”, afirmou. Por causa da CPMF e do IOF, acrescentou, a Ambev optou por fazer a operação no exterior e pagar dividendos lá fora para não ter que recolher esses tributos.
Para o procurador Rodrigo Moreira, representante da Fazenda Nacional, porém, não seria possível a turma analisar o propósito negocial da operação sem discutir outro argumento, que não chegou à 1ª Turma: a confusão patrimonial.
A discussão, porém, entre os conselheiros ficou concentrada na CSLL. A relatora, conselheira Livia de Carli Germano, representante dos contribuintes, ficou vencida no caso. Ela entendeu que as despesas de ágio são amortizáveis contabilmente, por não haver previsão para integrarem a base de cálculo da CSLL.
O voto foi seguido por dois conselheiros representantes dos contribuintes: Luis Henrique Marotti Toseli e Alexandre Evaristo Pinto. Os quatro representantes da Fazenda divergiram. Junto com eles votou o conselheiro Gustavo Guimarães Fonseca, representante dos contribuintes, formando maioria a favor da tributação.
A partir de setembro de 2019, com o voto de desempate favorável ao contribuintes, as empresas passaram a vencer as questões sobre CSLL na Câmara Superior, segundo o advogado e ex-conselheiro Caio Cesar Nader Quintella. Em geral, nos casos, representantes dos contribuintes votavam contra a tributação e os da Fazenda, a favor.
A questão analisada é se as regras de amortização de ágio do lucro real se aplicam à CSLL ou se não é possível, já que não haveria previsão legal para a sua inclusão na base de cálculo. Contribuintes costumam alegar que a regra específica de indedutibilidade das despesas de amortização contábil do ágio não se aplica à CSLL e que não há previsão legal que vede expressamente as deduções.
Já para a Receita, como não há previsão legal de exclusão da despesa de amortização com ágio da base de cálculo da CSLL, deve ser mantida, uma vez que a legislação determina que, para a apuração da base de cálculo da contribuição, deve ser observada a legislação aplicável ao IRPJ.
Quintella, que é ex-conselheiro do Carf, entende que a base de cálculo da CSLL é autônoma e legalmente delimitada por normas próprias, com identidade com a apuração do lucro real quando, expressamente, assim for determinado pela legislação.
No julgamento, o novo presidente do Carf, conselheiro Carlos Henrique de Oliveira, representante da Fazenda, afirmou que fica entre duas situações nesse tema por buscar sempre a essência e o conceito no seu raciocínio jurídico. “A questão aqui é se preciso de uma regra para incluir ou para excluir. Qual é a regra necessária?”, questionou.
Se a dedutibilidade do ágio não é uma despesa necessária, mas uma vantagem que o legislador outorga por interesses econômicos, afirmou, é necessário legislação específica. “A falta de uma legislação específica me faz deduzir que tenho que votar com a divergência”, disse o presidente do Carf.
Após o julgamento, o advogado da empresa informou que poderá levar a parte que perdeu à Justiça. Procurada pelo Valor, a Ambev afirmou que não comenta casos em andamento. A PGFN não pretende recorrer, segundo o procurador que atuou no caso.
Fonte: Valor Econômico, 12/07/2022.