16.12
Imprensa
Contencioso Administrativo e Judicial
Relator no STJ vota por proibir honorários por equidade em causas de valor alto
Por Danilo Vital
A fixação de honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância dos percentuais previstos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 o Código de Processo Civil, a depender da presença da Fazenda Pública na lide.
Com esse entendimento, o ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça, propôs à Corte Especial uma tese na qual afasta a possibilidade do uso da equidade para calcular honorários de sucumbência nos casos em que o valor da causa for considerado muito alto.
O voto foi apresentado nesta quarta-feira (15/12), no julgamento de quatro processos sob o rito dos recursos repetitivos. Nele, o colegiado vai aprovar tese, que terá observância obrigatória pelas instâncias ordinárias.
O julgamento foi interrompido por pedido de vista da ministra Nancy Andrighi, que prometeu trazer voto na primeira sessão da Corte Especial de 2022, marcada para 2 de fevereiro. Ainda assim, dois outros ministros adiantaram voto e acompanharam o relator: Mauro Campbell e Jorge Mussi.
A tese proposta pelo ministro Og Fernandes foi dividida em duas partes.
A fixação de honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância de percentuais previstos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 do CPC, a depender da presença da Fazenda Pública na lide, os quais serão subsequentemente calculados a partir do valor a) da condenação; b) do proveito econômico obtido; c) do valor atualizado da causa.
Apenas se admite o arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; b) o valor da causa for muito baixo.
1 milhão de advogados
O cerne da questão está na aplicação do parágrafo 8º do artigo 85 do CPC, que fala em apreciação equitativa de honorários para casos "em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo".
Para a Fazenda Pública, a regra é aplicável também aos casos de valores altos, em respeito à razoabilidade e proporcionalidade, além do intuito de evitar o enriquecimento sem causa de advogados que, ao defender clientes alvo de execuções fiscais milionárias, recebam honorários de sucumbência estratosféricos por trabalhos de muita simplicidade.
O tema é sensível para os mais de 1 milhão de advogados inscritos na OAB. Como mostrou a ConJur, a entidade se organizou na defesa da aplicação literal do artigo 85 do CPC. Levou aos autos diversos pareceres de juristas, tributaristas e especialistas em Direito Econômico e Direito Civil.
A OAB também levou a discussão ao Supremo Tribunal Federal, na Ação Declaratória de Constitucionalidade 71, em que pede que o Judiciário seja proibido de aplicar o artigo 85 do Código de Processo Civil fora das hipóteses literalmente estabelecidas. O processo não tem decisão liminar e foi redistribuído ao ministro Nunes Marques.
Litigou, agora aguenta
Relator, o ministro Og Fernandes deu razão aos argumentos da advocacia nacional. Destacou que, quando o parágrafo 8º do CPC menciona causas de valor inestimável para admitir fixação de honorários por equidade, está claramente tratando de hipóteses em que não é possível atribuir valor econômico, como ocorre em processos ambientais ou de família.
Afirmou que, se no CPC de 1973 a jurisprudência do STJ admitia amplamente o uso da equidade para fixar honorários, na versão aprovada em 2015 o legislador quis suprimir essa possibilidade. E apontou que o fato de alteração ter sido capitaneada no Congresso por entidades de classe não é suficiente para tornar a norma inconstitucional.
Para o ministro Og Fernandes, o argumento que a simplicidade da demanda ou o pouco trabalho exigido dos advogados levaria ao seu enriquecimento sem causa não pode permitir o uso da equidade, mas serve para balancear a fixação do percentual dentro dos limites do parágrafo 2º do artigo 85.
“Temos regra. No famoso bordão esportivo, a regra é clara, a meu ver. Essa proporcionalidade está estabelecida pelo Código, goste-se ou não”, disse.
Também deu razão a um dos pontos mais destacados nas duas horas e meia de sustentações orais, feitas por partes e amici curiae (amigos da corte): o efeito estrutural dos honorários de sucumbência. Sem eles, as partes não têm risco ao ajuizar processos, o que leva a aventuras jurídicas e ações temerárias.
A Fazenda Pública, a maior litigante do Judiciário brasileiro, por meio das execuções fiscais, sem dúvida o maior gargalo enfrentado nos juízos, é um exemplo perfeito apontado pelo relator.
“É muito comum ver, no STJ, a alegação de honorários excessivos em execuções fiscais de altíssimo valor posteriormente extintas. Tais execuções muitas vezes são propostas sem o devido escrutínio, sendo extintas por motivos previsíveis como problemas no polo passivo, o cancelamento da certidão da dívida ativa ou por estar o crédito prescrito”, pontuou.
Segundo o ministro Og, cabe ao autor de cada demanda — seja o estado, empresas ou cidadãos — ponderar bem a probabilidade de ganhos e prejuízos antes de ajuizar a demanda, sabendo que terá que arcar com honorários de acordo com proveito econômico ou valor da causa, caso vencido.
Miríade processual
Como mostrou a ConJur, esse repetitivo configura a análise mais abrangente que a Corte Especial vai fazer sobre o tema, mas não é o único caso em julgamento. Há ainda o Recurso Especial 1.644.077, que começou a ser apreciado em setembro de 2020 e está paralisado por pedido de vista do próprio ministro Og Fernandes.
O relator desse caso é o ministro Herman Benjamin, que não chegou a ler o voto, mas se posicionou por admitir o uso da equidade em causas de valor muito alto.
Ele foi acompanhado, em novembro de 2020, pela ministra Nancy Andrighi, para quem a justiça e a isonomia não servem apenas ao lado da majoração na hipótese de honorários ínfimos, mas também no caso de valores exorbitantes. Há, ainda, a tramitação de outro repetitivo pela 2ª Seção, que julga matéria de Direito Privado.
Repercussão
Para o advogado Felipe Omori, sócio da área tributária do KLA Advogados, apesar de o julgamento não ter terminado, "os votos que foram proferidos até agora indicam uma posição favorável para a superação de uma jurisprudência que validava a condenação irrisória da Fazenda Pública em honorários de sucumbência e caminha para diminuir a disparidade no tratamento entre Fazenda Pública e contribuintes em juízo".
Clique aqui para ler o memorial do Conselho Federal da OAB
REsp 1.850.512
REsp 1.877.883
REsp 1.906.623
Resp 1.906.618
Fonte: ConJur, 15/12/2021.
A fixação de honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância dos percentuais previstos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 o Código de Processo Civil, a depender da presença da Fazenda Pública na lide.
Com esse entendimento, o ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça, propôs à Corte Especial uma tese na qual afasta a possibilidade do uso da equidade para calcular honorários de sucumbência nos casos em que o valor da causa for considerado muito alto.
O voto foi apresentado nesta quarta-feira (15/12), no julgamento de quatro processos sob o rito dos recursos repetitivos. Nele, o colegiado vai aprovar tese, que terá observância obrigatória pelas instâncias ordinárias.
O julgamento foi interrompido por pedido de vista da ministra Nancy Andrighi, que prometeu trazer voto na primeira sessão da Corte Especial de 2022, marcada para 2 de fevereiro. Ainda assim, dois outros ministros adiantaram voto e acompanharam o relator: Mauro Campbell e Jorge Mussi.
A tese proposta pelo ministro Og Fernandes foi dividida em duas partes.
A fixação de honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória, nesses casos, a observância de percentuais previstos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 do CPC, a depender da presença da Fazenda Pública na lide, os quais serão subsequentemente calculados a partir do valor a) da condenação; b) do proveito econômico obtido; c) do valor atualizado da causa.
Apenas se admite o arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; b) o valor da causa for muito baixo.
1 milhão de advogados
O cerne da questão está na aplicação do parágrafo 8º do artigo 85 do CPC, que fala em apreciação equitativa de honorários para casos "em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo".
Para a Fazenda Pública, a regra é aplicável também aos casos de valores altos, em respeito à razoabilidade e proporcionalidade, além do intuito de evitar o enriquecimento sem causa de advogados que, ao defender clientes alvo de execuções fiscais milionárias, recebam honorários de sucumbência estratosféricos por trabalhos de muita simplicidade.
O tema é sensível para os mais de 1 milhão de advogados inscritos na OAB. Como mostrou a ConJur, a entidade se organizou na defesa da aplicação literal do artigo 85 do CPC. Levou aos autos diversos pareceres de juristas, tributaristas e especialistas em Direito Econômico e Direito Civil.
A OAB também levou a discussão ao Supremo Tribunal Federal, na Ação Declaratória de Constitucionalidade 71, em que pede que o Judiciário seja proibido de aplicar o artigo 85 do Código de Processo Civil fora das hipóteses literalmente estabelecidas. O processo não tem decisão liminar e foi redistribuído ao ministro Nunes Marques.
Litigou, agora aguenta
Relator, o ministro Og Fernandes deu razão aos argumentos da advocacia nacional. Destacou que, quando o parágrafo 8º do CPC menciona causas de valor inestimável para admitir fixação de honorários por equidade, está claramente tratando de hipóteses em que não é possível atribuir valor econômico, como ocorre em processos ambientais ou de família.
Afirmou que, se no CPC de 1973 a jurisprudência do STJ admitia amplamente o uso da equidade para fixar honorários, na versão aprovada em 2015 o legislador quis suprimir essa possibilidade. E apontou que o fato de alteração ter sido capitaneada no Congresso por entidades de classe não é suficiente para tornar a norma inconstitucional.
Para o ministro Og Fernandes, o argumento que a simplicidade da demanda ou o pouco trabalho exigido dos advogados levaria ao seu enriquecimento sem causa não pode permitir o uso da equidade, mas serve para balancear a fixação do percentual dentro dos limites do parágrafo 2º do artigo 85.
“Temos regra. No famoso bordão esportivo, a regra é clara, a meu ver. Essa proporcionalidade está estabelecida pelo Código, goste-se ou não”, disse.
Também deu razão a um dos pontos mais destacados nas duas horas e meia de sustentações orais, feitas por partes e amici curiae (amigos da corte): o efeito estrutural dos honorários de sucumbência. Sem eles, as partes não têm risco ao ajuizar processos, o que leva a aventuras jurídicas e ações temerárias.
A Fazenda Pública, a maior litigante do Judiciário brasileiro, por meio das execuções fiscais, sem dúvida o maior gargalo enfrentado nos juízos, é um exemplo perfeito apontado pelo relator.
“É muito comum ver, no STJ, a alegação de honorários excessivos em execuções fiscais de altíssimo valor posteriormente extintas. Tais execuções muitas vezes são propostas sem o devido escrutínio, sendo extintas por motivos previsíveis como problemas no polo passivo, o cancelamento da certidão da dívida ativa ou por estar o crédito prescrito”, pontuou.
Segundo o ministro Og, cabe ao autor de cada demanda — seja o estado, empresas ou cidadãos — ponderar bem a probabilidade de ganhos e prejuízos antes de ajuizar a demanda, sabendo que terá que arcar com honorários de acordo com proveito econômico ou valor da causa, caso vencido.
Miríade processual
Como mostrou a ConJur, esse repetitivo configura a análise mais abrangente que a Corte Especial vai fazer sobre o tema, mas não é o único caso em julgamento. Há ainda o Recurso Especial 1.644.077, que começou a ser apreciado em setembro de 2020 e está paralisado por pedido de vista do próprio ministro Og Fernandes.
O relator desse caso é o ministro Herman Benjamin, que não chegou a ler o voto, mas se posicionou por admitir o uso da equidade em causas de valor muito alto.
Ele foi acompanhado, em novembro de 2020, pela ministra Nancy Andrighi, para quem a justiça e a isonomia não servem apenas ao lado da majoração na hipótese de honorários ínfimos, mas também no caso de valores exorbitantes. Há, ainda, a tramitação de outro repetitivo pela 2ª Seção, que julga matéria de Direito Privado.
Repercussão
Para o advogado Felipe Omori, sócio da área tributária do KLA Advogados, apesar de o julgamento não ter terminado, "os votos que foram proferidos até agora indicam uma posição favorável para a superação de uma jurisprudência que validava a condenação irrisória da Fazenda Pública em honorários de sucumbência e caminha para diminuir a disparidade no tratamento entre Fazenda Pública e contribuintes em juízo".
Clique aqui para ler o memorial do Conselho Federal da OAB
REsp 1.850.512
REsp 1.877.883
REsp 1.906.623
Resp 1.906.618
Fonte: ConJur, 15/12/2021.