09.12
Imprensa
Direito Tributário
TRF2 suspende decisão que quebrou sigilo telemático em investigação fiscal
Por Camila Mazzotto
Por considerar que a medida foi baseada em "fundamentação absolutamente vazia" e violou o direito à privacidade, desembargador do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) expediu nesta sexta-feira (1º/7) liminar para suspender decisão de primeiro grau que havia quebrado o sigilo telemático de contas do Google cujos titulares são suspeitos de envolvimento em fraude fiscal.
O pedido de quebra de sigilo havia sido feito pela Receita Federal em ação de produção antecipada de provas. A liminar que o anulou atende a uma solicitação de mandado de segurança feita pelo Google Brasil Internet e Google LLC contra ato do juiz federal da 2ª Vara Federal Cível de Vitória/ES.
Em sua decisão, o desembargador Marcus Abraham afirmou que a quebra do sigilo não atendeu aos requisitos legais, "principalmente porque [o juiz] assim o fez sem apresentar uma fundamentação jurídica robusta, conforme a gravidade dos direitos envolvidos exige."
Em abril deste ano, a decisão de primeiro grau determinou a quebra do sigilo de todos os dados armazenados nos provedores Google e Microsoft referentes às contas dos titulares em questão, do período de 1º de janeiro de 2017 até 31 de dezembro de 2021.
A medida incluía o conteúdo das caixas de entrada, caixas de saída, lixeiras, pastas personalizadas criadas pelo cliente e todo os dados contidos em repositórios de arquivos, além de serviços de armazenamento de nuvem, como Google Drive e OneDrive.
Segundo o desembargador Abraham, a quebra do sigilo de conteúdo de e-mail por um período de quase cinco anos implicaria na "revelação não só de dados numéricos e financeiros, mas de dados que sequer se referem aos potenciais atos fraudulentos de interesse da Fazenda Nacional".
Em sua grande maioria, prosseguiu o magistrado, seriam "informações e dados da intimidade privada dos titulares dos e-mails, constituindo uma grave violação à privacidade, direito fundamental."
O pedido de quebra havia sido ajuizado pela Receita Federal em procedimento de produção antecipada de provas, com o objetivo de subsidiar investigação fiscal relativa à emissão de "notas fiscais frias" por empresas administradas pela mesma pessoa, em um suposto esquema fraudulento que visava reduzir as obrigações tributárias de terceiros.
O órgão alegou que a medida possibilitaria a colheita de novos elementos de prova que, por sua vez, poderiam indicar as empresas responsáveis pelo esquema. O juiz de primeiro grau entendeu que o ato era "necessário para a continuidade das investigações" e que a quebra de sigilo telemático não está restrita às investigações criminais.
Violação de direitos
Ao analisar o caso no TRF-2, o desembargador lembrou que o sigilo do conteúdo de correspondências, comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas são assegurados pela Constituição no art. 5º, podendo ser quebrado somente por ordem judicial fundamentada e para fins de investigação criminal ou instrução processual penal — o que não é o caso dos autos, segundo Abraham.
O magistrado também destacou que a obrigação das empresas de prestar à autoridade administrativa todas as informações com relação a bens, negócios ou atividades de terceiros "não abrange a prestação de informações quanto a fatos sobre os quais o informante esteja legalmente obrigado a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão", conforme a Lei nº 9.296/96.
Para Abraham, o interesse público de uma investigação fiscal, com o propósito de melhor identificar os reais responsáveis pelo recolhimento de tributos, também "não possui um valor jurídico maior que o direito à privacidade e à intimidade a ponto de justificar a sua relativização".
"Diante disso, tenho que a decisão ora impugnada ao determinar a quebra de sigilo telemático, permitindo o acesso a mensagens privadas, em um grande período, mostra-se teratológica e arbitrária", afirmou na decisão.
Para o magistrado, é "preocupante" o risco da Receita Federal passar a adotar este procedimento "sempre que precisar de maiores elementos para efetuar lançamentos tributários", o que enfraqueceria direitos fundamentais em detrimento da necessidade de investigação para fins de cobrança de tributos.
Seria como ingressar no mundo fictício descrito por George Orwell no romance distópico de sua autoria intitulado "1984", comparou Abraham, "em cuja sociedade todas as pessoas se submetiam a uma contínua vigília das autoridades, de nítido viés totalitário".
Procurada pela ConJur para comentar a decisão favorável à empresa, a assessoria de imprensa do Google ainda não havia retornado até a conclusão deste texto.
MS Nº 5009075-14.2022.4.02.0000/ES
Fonte: ConJur, 01/07/2022.
Por considerar que a medida foi baseada em "fundamentação absolutamente vazia" e violou o direito à privacidade, desembargador do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) expediu nesta sexta-feira (1º/7) liminar para suspender decisão de primeiro grau que havia quebrado o sigilo telemático de contas do Google cujos titulares são suspeitos de envolvimento em fraude fiscal.
O pedido de quebra de sigilo havia sido feito pela Receita Federal em ação de produção antecipada de provas. A liminar que o anulou atende a uma solicitação de mandado de segurança feita pelo Google Brasil Internet e Google LLC contra ato do juiz federal da 2ª Vara Federal Cível de Vitória/ES.
Em sua decisão, o desembargador Marcus Abraham afirmou que a quebra do sigilo não atendeu aos requisitos legais, "principalmente porque [o juiz] assim o fez sem apresentar uma fundamentação jurídica robusta, conforme a gravidade dos direitos envolvidos exige."
Em abril deste ano, a decisão de primeiro grau determinou a quebra do sigilo de todos os dados armazenados nos provedores Google e Microsoft referentes às contas dos titulares em questão, do período de 1º de janeiro de 2017 até 31 de dezembro de 2021.
A medida incluía o conteúdo das caixas de entrada, caixas de saída, lixeiras, pastas personalizadas criadas pelo cliente e todo os dados contidos em repositórios de arquivos, além de serviços de armazenamento de nuvem, como Google Drive e OneDrive.
Segundo o desembargador Abraham, a quebra do sigilo de conteúdo de e-mail por um período de quase cinco anos implicaria na "revelação não só de dados numéricos e financeiros, mas de dados que sequer se referem aos potenciais atos fraudulentos de interesse da Fazenda Nacional".
Em sua grande maioria, prosseguiu o magistrado, seriam "informações e dados da intimidade privada dos titulares dos e-mails, constituindo uma grave violação à privacidade, direito fundamental."
O pedido de quebra havia sido ajuizado pela Receita Federal em procedimento de produção antecipada de provas, com o objetivo de subsidiar investigação fiscal relativa à emissão de "notas fiscais frias" por empresas administradas pela mesma pessoa, em um suposto esquema fraudulento que visava reduzir as obrigações tributárias de terceiros.
O órgão alegou que a medida possibilitaria a colheita de novos elementos de prova que, por sua vez, poderiam indicar as empresas responsáveis pelo esquema. O juiz de primeiro grau entendeu que o ato era "necessário para a continuidade das investigações" e que a quebra de sigilo telemático não está restrita às investigações criminais.
Violação de direitos
Ao analisar o caso no TRF-2, o desembargador lembrou que o sigilo do conteúdo de correspondências, comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas são assegurados pela Constituição no art. 5º, podendo ser quebrado somente por ordem judicial fundamentada e para fins de investigação criminal ou instrução processual penal — o que não é o caso dos autos, segundo Abraham.
O magistrado também destacou que a obrigação das empresas de prestar à autoridade administrativa todas as informações com relação a bens, negócios ou atividades de terceiros "não abrange a prestação de informações quanto a fatos sobre os quais o informante esteja legalmente obrigado a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão", conforme a Lei nº 9.296/96.
Para Abraham, o interesse público de uma investigação fiscal, com o propósito de melhor identificar os reais responsáveis pelo recolhimento de tributos, também "não possui um valor jurídico maior que o direito à privacidade e à intimidade a ponto de justificar a sua relativização".
"Diante disso, tenho que a decisão ora impugnada ao determinar a quebra de sigilo telemático, permitindo o acesso a mensagens privadas, em um grande período, mostra-se teratológica e arbitrária", afirmou na decisão.
Para o magistrado, é "preocupante" o risco da Receita Federal passar a adotar este procedimento "sempre que precisar de maiores elementos para efetuar lançamentos tributários", o que enfraqueceria direitos fundamentais em detrimento da necessidade de investigação para fins de cobrança de tributos.
Seria como ingressar no mundo fictício descrito por George Orwell no romance distópico de sua autoria intitulado "1984", comparou Abraham, "em cuja sociedade todas as pessoas se submetiam a uma contínua vigília das autoridades, de nítido viés totalitário".
Procurada pela ConJur para comentar a decisão favorável à empresa, a assessoria de imprensa do Google ainda não havia retornado até a conclusão deste texto.
MS Nº 5009075-14.2022.4.02.0000/ES
Fonte: ConJur, 01/07/2022.