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A cláusula de eleição de foro estrangeiro em contratos internacionais no novo Código de Processo Civil

Pedro Henrique Barbisan Bertuol

A celebração de contratos internacionais entre partes domiciliadas em países distintos é realidade cada vez mais presente no atual contexto em que vivemos. Nesses contratos, tanto a escolha da lei aplicável quanto do foro competente para julgar eventuais disputas são temas de grande relevância e que merecem atenção dos envolvidos, tendo em vista a repercussão jurídica e financeira que essas escolhas podem trazer às partes no futuro.

Enquanto a possibilidade de as partes escolherem livremente e de forma direta a lei aplicável ao contrato ainda permanece nebulosa na doutrina e na jurisprudência brasileira, principalmente em razão da ausência de expressa previsão legal que a autorize, a possibilidade de eleição de foro estrangeiro em contratos internacionais é reconhecida de forma pacífica, inclusive pelas cortes superiores.

Contudo, no âmbito do antigo Código de Processo Civil, a eficácia da cláusula era demasiadamente restrita, já que a opção das partes pela jurisdição estrangeira não era capaz de afastar por completo a jurisdição brasileira nas três hipóteses de competência concorrente listadas no artigo 88[1]: (i) quando o réu estivesse domiciliado no Brasil; (ii) quando no Brasil tivesse de ser cumprida a obrigação; ou (iii) quando o fundamento fosse fato ocorrido ou ato praticado no Brasil. Na prática, a ocorrência de alguma dessas três hipóteses permitia que qualquer das partes do contrato pudesse optar, a seu exclusivo critério, por ajuizar a ação tanto no foro estrangeiro contratualmente eleito quanto no território brasileiro, o que enfraquecia o alcance da eleição de foro previamente pactuada.

O novo CPC inovou nesse sentido ao reconhecer expressamente a possibilidade de as partes afastarem por completo, da jurisdição brasileira, o julgamento de ação relativa a contrato internacional, inclusive nas hipóteses de competência concorrente, mediante o ajuste de “cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro”, conforme previsão do artigo 25:

Art. 25.  Não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, arguida pelo réu na contestação.

Trata-se de importante inovação, que privilegia a autonomia da vontade das partes e busca conferir-lhes maior segurança jurídica, pois determina que sua escolha pelo foro estrangeiro deve ser respeitada pela autoridade judiciária brasileira. Para maior efetividade, é importante que as partes que desejem incluir cláusula de eleição de foro estrangeiro em contrato internacional observem os seguintes pontos:

- A eleição de foro só produz efeito quando constar de instrumento escrito, no qual esteja mencionado expressamente o negócio jurídico a que a cláusula de eleição de foro se refere[2];

- O artigo 25 menciona foro exclusivo, motivo pelo qual recomenda-se que a cláusula mencione expressamente a exclusividade do foro eleito pelas partes, com exclusão de qualquer outro;

- Continua vedada a eleição de foro estrangeiro para decidir questões relativas a imóveis situados no Brasil ou inventário e partilha de bens que aqui se encontrem, sob as quais o Judiciário brasileiro tem competência exclusiva[3]; e

- A cláusula de eleição de foro estrangeiro poderá ser considerada ineficaz pelo juiz quando, no exame das circunstâncias do caso concreto, for constatada abusividade[4].

Por fim, cabe ressaltar que a aplicação do novo artigo 25 pelos tribunais brasileiros, apesar da clareza de sua redação, permanece incerta. De fato, enquanto há precedentes que já reconheceram a incompetência do Judiciário brasileiro diante da existência de cláusula de foro exclusivo estrangeiro, dando efetividade à norma, há outros casos em que a vontade das partes foi desconsiderada e a competência do Judiciário brasileiro foi reconhecida, mesmo diante da existência de cláusula nesse sentido[5]. Por isso, ainda que a alteração mereça ser celebrada, é necessário aguardar a definição do Judiciário, especialmente das cortes superiores, quanto ao tema.

[1] Reproduzido no artigo 21 do atual CPC.

[2] Artigo 63, §1º, do CPC.

[3] Artigo 23 do CPC.

[4] Artigo 63, §3º, do CPC.

[5] Apelação Cível nº 1.596.913-4, do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.
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