20.04

Imprensa

Brasil deve voltar a lista preliminar de violações de convenções trabalhistas da OIT

Por Assis Moreira

O Brasil deverá figurar de novo em uma lista de violação de convenções trabalhistas no mundo, na terça-feira, na esteira de denúncias apresentadas contra o governo brasileiro na Organização Internacional do Trabalho (OIT).

A sinalização é de que o país faça parte da lista preliminar de 39 casos. Em seguida, haverá negociações para uma lista final de cerca de 20 casos mais graves a serem examinados em junho pela Comissão de Aplicação de Normas, que é o órgão tripartite (empregados, empregadores e governos) da Conferência Internacional do Trabalho.

Se a Comissão de Normas confirmar que o Brasil violou convenções da OIT, ela pode determinar medidas de seguimento: que peritos voltem a examinar o assunto; que a OIT ofereça assistência técnica; que o governo apresente mais informações ou emende legislação ou prática etc.

Não há sanções como retaliação. Mas há pressão política para o país se enquadrar nas regras. Além disso, há estragos de imagem. A inclusão aumenta o risco de “barreira reputacional”, com consumidores de certos países podendo pressionar suas empresas a não importar de países que não respeitam padrões trabalhistas internacionais.

“O Brasil está na lista longa ainda por causa da convenção 98, de negociação coletiva, que denunciamos desde 2017”, afirmou Antonio Lisboa, secretário de relações internacionais da Central Única dos Trabalhadores (CUT), considerando que a situação piorou desde então.

Centrais sindicais têm denunciado sobretudo dois pontos. Primeiro, a prevalência do negociado sobre a legislação para, segundo os sindicatos, retirar direitos ou rebaixar o piso da lei, reduzindo o engajamento dos trabalhadores em negociações coletivas. Segundo, a possibilidade de que, por acordo individual, se deixar de aplicar convenções coletivas ou a própria legislação.

“A negociação coletiva podia prevalecer sobre a lei desde que para melhorar as condições dos trabalhadores, mas a reforma [aprovada] durante o governo [Michel] Temer prevê que se pode negociar abaixo da lei”, diz Lisboa. “Essa situação piorou com medidas tomadas na pandemia, com rompimento de contratos sem chamar os sindicatos”.

A representação de empregadores brasileiros, por sua vez, argumentou na OIT que a prevalência do negociado sobre a legislação era adotada em um terço dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), sem que se discutisse se isso prejudicava negociações coletivas.

Em 2019, a delegação dos empregadores apresentou um estudo da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) segundo o qual valores de reajustes salariais em 2017 e 2018 foram maiores na negociação descentralizada e direta entre empresa e o sindicato.

Quanto à negociação individual, os empregadores destacaram, na ocasião, que isso envolvia apenas 2,9% de todos os empregos formais, dos quais 77% eram de profissionais com alta qualificação e interesses mais individualizados.

A controvérsia sobre a convenção 98 já causou fortes fricções entre Brasília e a OIT. Durante o governo Temer, a percepção era de que a agência da Organização das Nações Unidas (ONU), desde o impeachment de Dilma Rousseff, tornara-se um palco de campanha política internacional contra o governo.

No governo Jair Bolsonaro, as reclamações aumentaram. Em 2020, os sindicatos questionavam na OIT a aplicação de pelo menos nove convenções internacionais pelo governo brasileiro.

Além da 98, sobre sindicalização e negociação coletiva, foram denunciadas as convenções 11, de direito de sindicalização na agricultura; 135, de proteção de representantes sindicais; 141, de organizações de trabalhadores rurais; 144, de consultas tripartites sobre normas internacionais do trabalho; 151, de relações de trabalho no serviço público; 154, de fomento à negociação coletiva; 155, sobre igualdade de oportunidades e tratamento para homens e mulheres trabalhadores; e 189, sobre trabalhadoras domésticas.

Para Lisboa, também a situação da convenção 169, sobre povos originários (nações indígenas, quilombolas) “é gravíssima”. Um dos principais pontos de controvérsia dessa convenção é sobre realização de obras em terras indígenas. O texto estabelece que, nesses casos, é preciso haver consultas às comunidades indígenas.

Em fevereiro deste ano, o Comitê Sobre a Aplicação de Convenções e Regulamentações da OIT, que faz o relatório que trabalhadores e empregadores usam para negociar as listas de casos de violação, acolheu “com agrado” a elaboração de protocolos de consultas por certas comunidades indígenas e o papel desempenhado pela Fundação Nacional do Índio Funai).

A comissão solicitou mais informações sobre o status desses protocolos ao governo brasileiro. Também pediu medidas sobre os trâmites relativos a delimitação, demarcação e registro de terras indígenas, pendentes na Funai, e sobre terras tradicionalmente ocupadas por comunidades quilombolas, perante o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

A negociação sobre a lista curta de casos mais graves de violações de convenções normalmente se dá entre trabalhadores e empregadores.

Neste ano, como a conferência internacional do trabalho novamente será virtual, por causa da pandemia, delegações de empregadores defendem uma lista de apenas 15 casos. Alguns governos defendem lista de 20, mas as centrais sindicais querem a manutenção de 24.

Fonte: Valor Econômico, 19/04/2021.
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