22.04
Imprensa
Direito do Trabalho
Justiça do Trabalho afasta indenização a jovem aprendiz por ausência de prova de assédio moral
Uma jovem que prestava serviços na condição de menor aprendiz ajuizou ação trabalhista pretendendo indenização de R$ 15 mil por assédio moral. Afirmou que, em virtude de sua aparência física, foi vítima de atos abusivos, humilhações e perseguição por parte de agentes públicos da Associação Profissionalizante do Menor de Belo Horizonte – Assprom, no setor em que trabalhava.
O caso foi decidido pela juíza Érica Martins Judice, titular da 11ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que, entretanto, não deu razão à aprendiz. Para a magistrada, não ficou provado que ela foi vítima de assédio moral no local de trabalho. Pelo contrário, as provas produzidas revelaram que a Associação fez tudo o que estava ao alcance para que a jovem se sentisse bem no local de serviço e superasse as dificuldades, muitas delas decorrentes de problemas familiares.
Entenda o caso
A jovem foi contratada pela Assprom, na condição de menor aprendiz, e, por cerca de dois anos (2017 a 2019), prestou serviços ao município de Belo Horizonte. Relatou que, certo dia, chegou ao trabalho com um novo corte de cabelo e foi alvo de insultos e zombaria por parte de duas servidoras, que lhe disseram que deveria ter um cabelo mais apresentável e mudar os brincos, chegando a questionar a origem humilde da jovem e a insinuar que ela fosse homossexual. No mês seguinte, após reclamar pelo assédio moral, disse ter sido transferida pela gerente para uma sala isolada, onde se sentia sozinha e sem utilidade, sem as demandas com as quais estava acostumada. Contou que, para piorar, a gerente lhe presenteou com um par de brincos discretos, dizendo que seriam mais adequados ao ambiente de trabalho do que os acessórios étnicos que usava.
De acordo com a tese da jovem, as ofensas apontadas teriam lhe causado “sérios danos psicológicos, a ponto de necessitar de ajuda psiquiátrica e psicológica”. Contou, ainda, que registrou boletim de ocorrência, o qual foi anexado ao processo, por entender que injúrias alegadas estariam relacionadas à sua condição racial.
A Associação negou a existência das ofensas noticiadas pela jovem, a quem cabia fazer prova das alegações. Mas, conforme pontuou a magistrada, a aprendiz não cumpriu esse encargo processual.
Depoimento
Em depoimento, a jovem declarou que trabalhava em sala de recepção, atendendo ao telefone. Os problemas surgiram quando cortou o cabelo e começou a sofrer com os comentários de duas servidoras. Após isso, teve um desentendimento profissional com uma delas, que lhe disse que era mal-educada porque “tinha sido criada com a cachorrada”. Contou que a gerente lhe deu um brinco bem pequeno, de presente de aniversário, dizendo que era para o seu visual ficar mais delicado. Procurou a psicóloga da Assprom para reclamar pelos maus tratos sofridos. Houve uma reunião no setor de trabalho dois ou três dias após a conversa com a psicóloga e, em seguida, foi colocada numa sala isolada, entendendo que era uma forma de mantê-la afastada. Afirmou que não ficou feliz com a mudança de local de trabalho, apesar de ter concordado, no momento. Declarou ainda que não recebeu apoio psicológico por parte da Assprom, mas sim de posto de saúde próximo à sua residência.
Prova documental – O programa de promoção do adolescente trabalhador/PPAT-PBH
Documentos anexados ao processo mostraram que a Assprom e o município de Belo Horizonte firmaram convênio de ação conjunta para a execução do Programa de Promoção do Adolescente Trabalhador/PPAT-PBH, visando à formalização de contratos de trabalho com adolescentes entre 16 e 18 anos, encaminhados pelos serviços de proteção social básica e especial do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).
Apoio social e familiar que ultrapassa a relação de emprego
A juíza apurou que, de acordo com os planos de trabalho, mais do que a relação de emprego, os adolescentes inseridos no PPAT têm acesso a uma rede de serviços de proteção social, voltados para o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, capacitação profissional e promoção da educação, com o objetivo de rompimento dos ciclos de pobreza, evasão escolar e vulnerabilidade social.
O olhar atento da Assprom e a difícil realidade no âmbito familiar
Em sua análise, a magistrada observou que a adolescente foi inserida no PPAT para que tivesse contato com o mundo do trabalho em um ambiente saudável e propício ao seu desenvolvimento profissional, educacional e social.
Documentos demonstraram que a Assprom acompanha o desenvolvimento do programa com entrevistas periódicas, nas quais o técnico responsável, indicado por ela, acompanha o desempenho do adolescente em suas atividades de trabalho e escolares.
Na ação que ajuizou contra a Assprom e o município de Belo Horizonte, a jovem apresentou relatório médico atestando que sofria de estresse. Mas a julgadora ponderou que não se pode concluir pelo nexo de causalidade com as ofensas narradas, tendo em vista que a jovem foi vítima de constrangimentos graves, de ordem pessoal, devido a problemas familiares, que poderiam ter desencadeado o estresse relatado naquele documento.
Na percepção da julgadora, a difícil realidade que vivenciava em família parece ter sido atenuada por um excelente convívio de trabalho. Tanto assim que, em vários relatórios de acompanhamento, a adolescente sempre se mostrava satisfeita e bem adaptada ao local de trabalho e aos objetivos do PPAT, inclusive chegou a informar à sua orientadora, cerca de 30 dias após a data de ocorrência das supostas ofensas, que havia sido aprovada para a faculdade.
Apoio psicológico
Uma psicóloga que atuava como técnica de acompanhamento da Assprom e que a acompanhou a jovem por cerca de quatro meses, no final de seu contrato junto ao município de Belo Horizonte, prestou depoimento ao juízo, na qualidade de informante. Ela relatou que, na época, a jovem aprendiz fez uma queixa a respeito da postura de duas servidoras públicas municipais e o fato foi levado imediatamente ao conhecimento do PPAT (Programa de Promoção do Adolescente Trabalhador no Município de Belo Horizonte). Ainda foi informada de que a adolescente seria transferida do posto de trabalho, para que ficasse mais próxima da sua coordenação. Contou que ofereceu à jovem acompanhamento psicológico disponibilizado pela Assprom aos beneficiários do PPAT, mas ela recusou, afirmando que já havia providenciado apoio psicológico por conta própria.
Prova testemunhal
Uma servidora, que foi apontada pela aprendiz como uma das pessoas que a teriam ofendido, ouvida como testemunha, disse que ambas sempre mantiveram um relacionamento cordial, inclusive com certa intimidade e confiança recíprocas. Relatou que tem uma filha homossexual e, por experiência própria, conhece o sofrimento que decorre de tal orientação sexual. Afirmou que apreciou o corte de cabelo da adolescente e chegou a elogiá-la, assim como várias pessoas do andar, “pois era um corte muito bonito e moderno”. Negou que havia zombaria acerca do corte de cabelo e que nunca teve notícia de tal fato. A testemunha contou que é engajada em projetos voltados para minorias sociais e, inclusive, foi nomeada Conselheira Titular no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente, representando a Secretaria Municipal da Fazenda. Entre suas atribuições, o conselho acolhe menores e analisa denúncias de violações de direitos. Ainda, segundo ela, a gerente deu os brincos à aprendiz como presente de aniversário.
A gerente, superiora hierárquica, também prestou depoimento como testemunha. Contou que a denúncia da jovem chocou o setor, que sempre acolheu menores aprendizes sem qualquer reclamação. Afirmou, inclusive, que mantinha contato com antigos aprendizes, tal era a afinidade que desenvolviam. De acordo com a testemunha, é hábito no setor fazerem festas bimestrais para comemoração de aniversários, com troca de presentes e que, por ocasião de seu aniversário de 18 anos, presenteou a jovem com um par de brincos. Após a denúncia noticiada pela Assprom, a gerente contou que colocou para trabalhar em uma sala próxima, como forma de prevenção, para acompanhar o que estava ocorrendo. A jovem passou, então, a trabalhar numa antessala, sendo que o trabalho consistia em entregar documentos e nem sempre era requisitada. Disse que a aprendiz podia ficar na própria sala, onde havia uma mesa redonda na qual estava autorizada a estudar. Emprestava os livros pessoais para leitura da jovem, liberando-a para estudar em todos os momentos vagos da jornada. Entre os livros, havia um sobre inteligência emocional.
Diante de todo o apurado, a magistrada não ficou convencida de que a adolescente teria sofrido as injúrias narradas. “Pelo contrário. A testemunha trazida pelo município de Belo Horizonte mostrou-se perplexa com a denúncia, pois os fatos narrados na exordial vão de encontro com os valores e princípios com que pauta sua conduta profissional, já que foi representante do órgão administrativo junto ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente. Também se mostrou indignada com a pecha de eventual comportamento homofóbico, já que é mãe de uma pessoa homossexual e se compadece com o sofrimento causado pelo preconceito de gênero”, registrou a sentença.
A juíza não constatou qualquer atitude discriminatória na conduta da gerente da jovem. Por inexistir prova de conduta ilícita dos agentes e da ofensa moral alegada, o pedido acerca da indenização por danos morais foi julgado improcedente. Não houve recurso ao TRT-MG.
Fonte: TRT3, 19/04/2022.
O caso foi decidido pela juíza Érica Martins Judice, titular da 11ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, que, entretanto, não deu razão à aprendiz. Para a magistrada, não ficou provado que ela foi vítima de assédio moral no local de trabalho. Pelo contrário, as provas produzidas revelaram que a Associação fez tudo o que estava ao alcance para que a jovem se sentisse bem no local de serviço e superasse as dificuldades, muitas delas decorrentes de problemas familiares.
Entenda o caso
A jovem foi contratada pela Assprom, na condição de menor aprendiz, e, por cerca de dois anos (2017 a 2019), prestou serviços ao município de Belo Horizonte. Relatou que, certo dia, chegou ao trabalho com um novo corte de cabelo e foi alvo de insultos e zombaria por parte de duas servidoras, que lhe disseram que deveria ter um cabelo mais apresentável e mudar os brincos, chegando a questionar a origem humilde da jovem e a insinuar que ela fosse homossexual. No mês seguinte, após reclamar pelo assédio moral, disse ter sido transferida pela gerente para uma sala isolada, onde se sentia sozinha e sem utilidade, sem as demandas com as quais estava acostumada. Contou que, para piorar, a gerente lhe presenteou com um par de brincos discretos, dizendo que seriam mais adequados ao ambiente de trabalho do que os acessórios étnicos que usava.
De acordo com a tese da jovem, as ofensas apontadas teriam lhe causado “sérios danos psicológicos, a ponto de necessitar de ajuda psiquiátrica e psicológica”. Contou, ainda, que registrou boletim de ocorrência, o qual foi anexado ao processo, por entender que injúrias alegadas estariam relacionadas à sua condição racial.
A Associação negou a existência das ofensas noticiadas pela jovem, a quem cabia fazer prova das alegações. Mas, conforme pontuou a magistrada, a aprendiz não cumpriu esse encargo processual.
Depoimento
Em depoimento, a jovem declarou que trabalhava em sala de recepção, atendendo ao telefone. Os problemas surgiram quando cortou o cabelo e começou a sofrer com os comentários de duas servidoras. Após isso, teve um desentendimento profissional com uma delas, que lhe disse que era mal-educada porque “tinha sido criada com a cachorrada”. Contou que a gerente lhe deu um brinco bem pequeno, de presente de aniversário, dizendo que era para o seu visual ficar mais delicado. Procurou a psicóloga da Assprom para reclamar pelos maus tratos sofridos. Houve uma reunião no setor de trabalho dois ou três dias após a conversa com a psicóloga e, em seguida, foi colocada numa sala isolada, entendendo que era uma forma de mantê-la afastada. Afirmou que não ficou feliz com a mudança de local de trabalho, apesar de ter concordado, no momento. Declarou ainda que não recebeu apoio psicológico por parte da Assprom, mas sim de posto de saúde próximo à sua residência.
Prova documental – O programa de promoção do adolescente trabalhador/PPAT-PBH
Documentos anexados ao processo mostraram que a Assprom e o município de Belo Horizonte firmaram convênio de ação conjunta para a execução do Programa de Promoção do Adolescente Trabalhador/PPAT-PBH, visando à formalização de contratos de trabalho com adolescentes entre 16 e 18 anos, encaminhados pelos serviços de proteção social básica e especial do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).
Apoio social e familiar que ultrapassa a relação de emprego
A juíza apurou que, de acordo com os planos de trabalho, mais do que a relação de emprego, os adolescentes inseridos no PPAT têm acesso a uma rede de serviços de proteção social, voltados para o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, capacitação profissional e promoção da educação, com o objetivo de rompimento dos ciclos de pobreza, evasão escolar e vulnerabilidade social.
O olhar atento da Assprom e a difícil realidade no âmbito familiar
Em sua análise, a magistrada observou que a adolescente foi inserida no PPAT para que tivesse contato com o mundo do trabalho em um ambiente saudável e propício ao seu desenvolvimento profissional, educacional e social.
Documentos demonstraram que a Assprom acompanha o desenvolvimento do programa com entrevistas periódicas, nas quais o técnico responsável, indicado por ela, acompanha o desempenho do adolescente em suas atividades de trabalho e escolares.
Na ação que ajuizou contra a Assprom e o município de Belo Horizonte, a jovem apresentou relatório médico atestando que sofria de estresse. Mas a julgadora ponderou que não se pode concluir pelo nexo de causalidade com as ofensas narradas, tendo em vista que a jovem foi vítima de constrangimentos graves, de ordem pessoal, devido a problemas familiares, que poderiam ter desencadeado o estresse relatado naquele documento.
Na percepção da julgadora, a difícil realidade que vivenciava em família parece ter sido atenuada por um excelente convívio de trabalho. Tanto assim que, em vários relatórios de acompanhamento, a adolescente sempre se mostrava satisfeita e bem adaptada ao local de trabalho e aos objetivos do PPAT, inclusive chegou a informar à sua orientadora, cerca de 30 dias após a data de ocorrência das supostas ofensas, que havia sido aprovada para a faculdade.
Apoio psicológico
Uma psicóloga que atuava como técnica de acompanhamento da Assprom e que a acompanhou a jovem por cerca de quatro meses, no final de seu contrato junto ao município de Belo Horizonte, prestou depoimento ao juízo, na qualidade de informante. Ela relatou que, na época, a jovem aprendiz fez uma queixa a respeito da postura de duas servidoras públicas municipais e o fato foi levado imediatamente ao conhecimento do PPAT (Programa de Promoção do Adolescente Trabalhador no Município de Belo Horizonte). Ainda foi informada de que a adolescente seria transferida do posto de trabalho, para que ficasse mais próxima da sua coordenação. Contou que ofereceu à jovem acompanhamento psicológico disponibilizado pela Assprom aos beneficiários do PPAT, mas ela recusou, afirmando que já havia providenciado apoio psicológico por conta própria.
Prova testemunhal
Uma servidora, que foi apontada pela aprendiz como uma das pessoas que a teriam ofendido, ouvida como testemunha, disse que ambas sempre mantiveram um relacionamento cordial, inclusive com certa intimidade e confiança recíprocas. Relatou que tem uma filha homossexual e, por experiência própria, conhece o sofrimento que decorre de tal orientação sexual. Afirmou que apreciou o corte de cabelo da adolescente e chegou a elogiá-la, assim como várias pessoas do andar, “pois era um corte muito bonito e moderno”. Negou que havia zombaria acerca do corte de cabelo e que nunca teve notícia de tal fato. A testemunha contou que é engajada em projetos voltados para minorias sociais e, inclusive, foi nomeada Conselheira Titular no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente, representando a Secretaria Municipal da Fazenda. Entre suas atribuições, o conselho acolhe menores e analisa denúncias de violações de direitos. Ainda, segundo ela, a gerente deu os brincos à aprendiz como presente de aniversário.
A gerente, superiora hierárquica, também prestou depoimento como testemunha. Contou que a denúncia da jovem chocou o setor, que sempre acolheu menores aprendizes sem qualquer reclamação. Afirmou, inclusive, que mantinha contato com antigos aprendizes, tal era a afinidade que desenvolviam. De acordo com a testemunha, é hábito no setor fazerem festas bimestrais para comemoração de aniversários, com troca de presentes e que, por ocasião de seu aniversário de 18 anos, presenteou a jovem com um par de brincos. Após a denúncia noticiada pela Assprom, a gerente contou que colocou para trabalhar em uma sala próxima, como forma de prevenção, para acompanhar o que estava ocorrendo. A jovem passou, então, a trabalhar numa antessala, sendo que o trabalho consistia em entregar documentos e nem sempre era requisitada. Disse que a aprendiz podia ficar na própria sala, onde havia uma mesa redonda na qual estava autorizada a estudar. Emprestava os livros pessoais para leitura da jovem, liberando-a para estudar em todos os momentos vagos da jornada. Entre os livros, havia um sobre inteligência emocional.
Diante de todo o apurado, a magistrada não ficou convencida de que a adolescente teria sofrido as injúrias narradas. “Pelo contrário. A testemunha trazida pelo município de Belo Horizonte mostrou-se perplexa com a denúncia, pois os fatos narrados na exordial vão de encontro com os valores e princípios com que pauta sua conduta profissional, já que foi representante do órgão administrativo junto ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente. Também se mostrou indignada com a pecha de eventual comportamento homofóbico, já que é mãe de uma pessoa homossexual e se compadece com o sofrimento causado pelo preconceito de gênero”, registrou a sentença.
A juíza não constatou qualquer atitude discriminatória na conduta da gerente da jovem. Por inexistir prova de conduta ilícita dos agentes e da ofensa moral alegada, o pedido acerca da indenização por danos morais foi julgado improcedente. Não houve recurso ao TRT-MG.
Fonte: TRT3, 19/04/2022.