22.10
Imprensa
Direito do Trabalho
STF julgará regra para indenizar trabalhadores
Por Adriana Aguiar
O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar hoje se mantém ou derruba os parâmetros estabelecidos pela reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017) para pedidos de reparação por danos morais.
O artigo 223-G, incluído na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) pela reforma, atrela o valor de indenizações à remuneração dos trabalhadores que sofreram o dano.
Na sessão de julgamentos de hoje, foram ouvidas diversas entidades sobre o assunto. Os ministros ainda não se manifestaram. O tema deve voltar à pauta na próxima quarta-feira, com o voto do relator, ministro Gilmar Mendes.
O artigo questionado estabeleceu que as indenizações devem variar de três a cinquenta vezes o último salário do trabalhador, a depender do grau da ofensa, que pode ser desde leve a gravíssima. Essa tarifação foi questionada no STF por meio de ações diretas de inconstitucionalidade (Adins nº 5870, nº 6069, nº 6082 e 6050).
A sessão começou com as sustentações orais. Muitas das entidades usaram como exemplo o rompimento das barragens da Vale em Brumadinho (MG), ocorrido em 25 de janeiro de 2019, considerado o maior acidente de trabalho no Brasil. O desastre causou a morte de 270 pessoas, incluindo oito desaparecidas, em números oficiais divulgados em 6 de outubro de 2021.
Muitos mencionaram que, se fossem seguidos os critérios da Lei da Reforma Trabalhista, a família de um engenheiro morto no acidente deveria receber muito mais do que um servente terceirizado, por exemplo.
O advogado Alberto Pavie, que assessora a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) — autora das Adins nº 5870 e 6050 - deu como exemplo, a família de um servente que ganhava R$ 1 mil por mês, que poderia receber até R$ 50 mil de indenização. Já um diretor, que ganhava cerca de R$ 40 mil, a indenização à família poderia chegar a R$ 2 milhões.
“Os trabalhadores têm que ser tratados como iguais, pouco importa sua remuneração, eles estavam no mesmo acidente”, disse.
Pela redação atual da CLT, em caso de ofensa gravíssima à vida, à saúde ou à integridade física em uma relação empregatícia, o valor da indenização não poderá ultrapassar 50 vezes o valor do último salário contratual do trabalhador.
Pavie ainda ressaltou que os incisos I, II, III e IV do artigo 223-G da CLT contrariam o princípio da isonomia e restringem a atuação do Poder Judiciário e a independência dos magistrados, ao impedir que o juiz fixe o valor mais adequado ao caso. Ainda relembrou que o Supremo já declarou a inconstitucionalidade da antiga Lei de Imprensa, de 1967, que tinha disposição semelhante, ao tentar tabelar os valores de indenização que seriam pagos por jornalistas condenados por reportagens que teriam ofendido a honra, a intimidade, ou imagem de alguém (ADPF 130).
Para a advogada Zilmara David de Alencar, que representou a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI), autora da Adin nº 6082, o artigo questionado trata da “mercantilização do eu, da vida, daquele dano que atinge a alma”. Para ela, também não se poderia usar como parâmetro para indenização os salários dos funcionários.
“Um servente e um engenheiro que estavam no refeitório [em Brumadinho], comendo a mesma comida, não podem, com esses parâmetros limitadores, ter tratamentos diferenciados”, afirmou.
Neste mesmo sentido, se manifestou o advogado Antonio Fabrício de Mattos Gonçalves, representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), autora da Adin nº 6069. Ele também citou Brumadinho como exemplo, e ressaltou que, no caso, apesar da lei, as indenizações nos acordos acabaram sendo de valores muito superiores ao teto da lei.
Já o ministro Bruno Bianco Leal, Advogado-Geral da União (AGU), afirmou que não há impedimento legal para fixar parâmetros e que a sua função é impedir que sejam estabelecidas indenizações irrisórias ou muito altas. E que os valores de reparação por danos morais podem vir acompanhados de indenizações por danos materiais, lucros cessantes e emergentes.
Para ele, o caso analisado agora é diferente do da Lei de Imprensa, que tratou de parâmetros para uma categoria específica. Leal ainda ressaltou que, por outro lado, o Supremo já declarou constitucional parâmetros para a concessão de indenização por danos decorrentes de acidentes para o seguro obrigatório (DPVAT) nas Adins nº ADI 4350 e 4327.
Carolina Tupinambá, advogada da Associação Brasileira de Magistrados do Trabalho (ABMT), fez questão de dizer que a entidade diverge da Anamatra sobre a inconstitucionalidade da parametrização. “Isso evita a discricionarieade na fixação de alguns parâmetros”.
O procurador-geral da República, por fim, defendeu a inconstitucionalidade da medida por violação de princípios constitucionais como dignidade humana e igualdade de direitos.
Em seguida, o Pleno do STF reconheceu a legitimidade da Anamatra e da CNTI para propor as ações. E extinguiu, por perda de objeto, a Adin nº 5870, que questionava a Medida Provisória 808/2017, cuja vigência encerrou-se no dia 23 de abril de 2018, e previa esses mesmos parâmetros.
A sessão foi encerrada pelo adiantar da hora e o julgamento das ações será retomado na próxima quarta-feira, segundo anúncio da vice-presidente do STF, ministra Rosa Weber, que presidiu a sessão.
Fonte: Valor Econômico, 21/10/2021.
O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar hoje se mantém ou derruba os parâmetros estabelecidos pela reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017) para pedidos de reparação por danos morais.
O artigo 223-G, incluído na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) pela reforma, atrela o valor de indenizações à remuneração dos trabalhadores que sofreram o dano.
Na sessão de julgamentos de hoje, foram ouvidas diversas entidades sobre o assunto. Os ministros ainda não se manifestaram. O tema deve voltar à pauta na próxima quarta-feira, com o voto do relator, ministro Gilmar Mendes.
O artigo questionado estabeleceu que as indenizações devem variar de três a cinquenta vezes o último salário do trabalhador, a depender do grau da ofensa, que pode ser desde leve a gravíssima. Essa tarifação foi questionada no STF por meio de ações diretas de inconstitucionalidade (Adins nº 5870, nº 6069, nº 6082 e 6050).
A sessão começou com as sustentações orais. Muitas das entidades usaram como exemplo o rompimento das barragens da Vale em Brumadinho (MG), ocorrido em 25 de janeiro de 2019, considerado o maior acidente de trabalho no Brasil. O desastre causou a morte de 270 pessoas, incluindo oito desaparecidas, em números oficiais divulgados em 6 de outubro de 2021.
Muitos mencionaram que, se fossem seguidos os critérios da Lei da Reforma Trabalhista, a família de um engenheiro morto no acidente deveria receber muito mais do que um servente terceirizado, por exemplo.
O advogado Alberto Pavie, que assessora a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) — autora das Adins nº 5870 e 6050 - deu como exemplo, a família de um servente que ganhava R$ 1 mil por mês, que poderia receber até R$ 50 mil de indenização. Já um diretor, que ganhava cerca de R$ 40 mil, a indenização à família poderia chegar a R$ 2 milhões.
“Os trabalhadores têm que ser tratados como iguais, pouco importa sua remuneração, eles estavam no mesmo acidente”, disse.
Pela redação atual da CLT, em caso de ofensa gravíssima à vida, à saúde ou à integridade física em uma relação empregatícia, o valor da indenização não poderá ultrapassar 50 vezes o valor do último salário contratual do trabalhador.
Pavie ainda ressaltou que os incisos I, II, III e IV do artigo 223-G da CLT contrariam o princípio da isonomia e restringem a atuação do Poder Judiciário e a independência dos magistrados, ao impedir que o juiz fixe o valor mais adequado ao caso. Ainda relembrou que o Supremo já declarou a inconstitucionalidade da antiga Lei de Imprensa, de 1967, que tinha disposição semelhante, ao tentar tabelar os valores de indenização que seriam pagos por jornalistas condenados por reportagens que teriam ofendido a honra, a intimidade, ou imagem de alguém (ADPF 130).
Para a advogada Zilmara David de Alencar, que representou a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (CNTI), autora da Adin nº 6082, o artigo questionado trata da “mercantilização do eu, da vida, daquele dano que atinge a alma”. Para ela, também não se poderia usar como parâmetro para indenização os salários dos funcionários.
“Um servente e um engenheiro que estavam no refeitório [em Brumadinho], comendo a mesma comida, não podem, com esses parâmetros limitadores, ter tratamentos diferenciados”, afirmou.
Neste mesmo sentido, se manifestou o advogado Antonio Fabrício de Mattos Gonçalves, representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), autora da Adin nº 6069. Ele também citou Brumadinho como exemplo, e ressaltou que, no caso, apesar da lei, as indenizações nos acordos acabaram sendo de valores muito superiores ao teto da lei.
Já o ministro Bruno Bianco Leal, Advogado-Geral da União (AGU), afirmou que não há impedimento legal para fixar parâmetros e que a sua função é impedir que sejam estabelecidas indenizações irrisórias ou muito altas. E que os valores de reparação por danos morais podem vir acompanhados de indenizações por danos materiais, lucros cessantes e emergentes.
Para ele, o caso analisado agora é diferente do da Lei de Imprensa, que tratou de parâmetros para uma categoria específica. Leal ainda ressaltou que, por outro lado, o Supremo já declarou constitucional parâmetros para a concessão de indenização por danos decorrentes de acidentes para o seguro obrigatório (DPVAT) nas Adins nº ADI 4350 e 4327.
Carolina Tupinambá, advogada da Associação Brasileira de Magistrados do Trabalho (ABMT), fez questão de dizer que a entidade diverge da Anamatra sobre a inconstitucionalidade da parametrização. “Isso evita a discricionarieade na fixação de alguns parâmetros”.
O procurador-geral da República, por fim, defendeu a inconstitucionalidade da medida por violação de princípios constitucionais como dignidade humana e igualdade de direitos.
Em seguida, o Pleno do STF reconheceu a legitimidade da Anamatra e da CNTI para propor as ações. E extinguiu, por perda de objeto, a Adin nº 5870, que questionava a Medida Provisória 808/2017, cuja vigência encerrou-se no dia 23 de abril de 2018, e previa esses mesmos parâmetros.
A sessão foi encerrada pelo adiantar da hora e o julgamento das ações será retomado na próxima quarta-feira, segundo anúncio da vice-presidente do STF, ministra Rosa Weber, que presidiu a sessão.
Fonte: Valor Econômico, 21/10/2021.