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Agronegócio

Senado trabalha em substitutivo ao projeto do novo Código Comercial

Por Joice Bacelo e Beatriz Olivon

O polêmico projeto do novo Código Comercial, que tramita desde 2013 no Senado, será substituído por um novo texto. Apesar de ter sido aprovado em comissão especial em 2018 e em tese estar pronto para ser levado à votação em Plenário, os parlamentares decidiram trabalhar uma nova versão. Uma nova comissão especial para tratar do tema realiza hoje a primeira reunião para discutir a proposta do substitutivo ao Projeto de Lei nº 487.

A relatora, senadora Soraya Thronicke (PSL-MS), já tem o que seria um texto-base. É uma proposta bem mais enxuta que a original. A versão elaborada por sua equipe tem 173 artigos - a original conta com quase mil. “No substitutivo estão pontos urgentes”, diz o professor Fábio Ulhoa Coelho, que integra a equipe de juristas que auxilia a senadora.

O Valor teve acesso, com exclusividade, à minuta. O texto estabelece os princípios do direito comercial, trata da organização, deveres e obrigações das empresas - incluindo o direito societário.

Uma das principais novidades seria a possibilidade de o empresário individual exercer sua atividade em “regime fiduciário”, que seria uma espécie de blindagem ao patrimônio pessoal. A medida prevê a criação de um patrimônio separado e exclusivo à atividade empresarial. Hoje não há essa separação. O empresário ao assumir obrigações, as dívidas contraídas podem afetar o patrimônio pessoal.

Advogados afirmam, no entanto, que a Lei da Liberdade Econômica (nº 13.874), publicada em setembro, tratou sobre isso, em parte. Criou a figura da sociedade limitada unipessoal. Ao ser constituída, adquire patrimônio próprio e exclusivo ao exercício da atividade econômica - da mesma forma como pretende, para o empresário individual, a minuta de substitutivo do novo Código Comercial.

A versão elaborada pela equipe da senadora Soraya Thronicke também prevê a sociedade limitada unipessoal. E vai um pouco mais longe: cria a sociedade anônima unipessoal. O texto, além disso, prevê a extinção da Empresa Individual de Responsabilidade Ilimitada (Eireli).

“A Lei da Liberdade Econômica já esvaziou a Eireli”, diz um advogado. “A unipessoal oferece segurança e, diferentemente da Eireli, não exige capital social mínimo. Mesmo que não seja extinta vai acabar caindo em desuso.”

A minuta de substitutivo ao PL nº 487 foi divulgada pela equipe da senadora em um grupo de WhatsApp em que participam cerca de 90 advogados. Os profissionais, segundo instruções que foram passadas nesse grupo, têm até o dia 28 para enviar sugestões e no dia 8 de novembro haverá uma reunião presencial, às 14h, no Senado.

Há um burburinho entre os profissionais de que a versão final do substitutivo será apresentada nesta data. A senadora, no entanto, não confirma. Soraya Thronicke afirmou ao Valor que “o direito empresarial é vasto” e que a sua equipe está trabalhando “de forma otimizada e acelerada, mas com a cautela necessária”.

Mas há um certo ruído entre os senadores que fazem parte da comissão instalada para tratar do assunto. Alguns deles veem a criação do grupo de WhatsApp como uma ação paralela ao trâmite legislativo. “Tudo o que ela está fazendo não existe de forma oficial”, diz uma fonte. “Não há apoio dos senadores”, acrescenta.

O presidente da comissão, senador Angelo Coronel (PSD-BA), pretende propor, na reunião de hoje, um cronograma dos trabalhos - o procedimento das reuniões e a data de uma possível audiência pública. Ele entende como “prematuro” falar sobre as mudanças no texto agora e diz não ter conhecimento da minuta que foi elaborada pela relatora.

“Não podemos fazer nada de afogadilho”, afirma. “Para mim é novidade ter texto pronto. Texto pronto é quando é levado para apreciação do Plenário. Não adianta ter pressa.” Para o senador, as propostas devem ser discutidas em grupo. “Se fosse só para uma pessoa fazer e aprovar não precisaria de comissão. Não será uma comissão do ‘amém’”, frisou ele, que conta com assessoria de cinco advogados.

O projeto que será descartado foi apresentado ao Senado em 2013 e a versão original tem a autoria do senador Renan Calheiros (MDB-AL). A comissão especial foi instalada somente em 2017 e o texto foi aprovado com mudanças em cerca de 20 pontos em dezembro do ano passado. A criação de um novo código é permeada de polêmicas. Nunca teve a unanimidade do empresariado. Quem é contra argumenta, principalmente, que as empresas já estão adaptadas às leis atuais e uma mudança traria altos gastos desnecessários.

O Código original é da época de Dom Pedro II, promulgado em 1850. Tratava, além das relações comerciais, de falências e direito marítimo. Com o passar do tempo, partes foram revogadas ou substituídas. Hoje não existe mais um código exclusivamente comercial. Parte das questões é tratada no Código Civil e há outras em leis esparsas. Todo o trecho relacionado ao direito marítimo - que não está na minuta do substitutivo -, porém, ainda corresponde às normas da época do império.

Fonte: Valor Econômico, 23/10/2019.
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